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"Igrejas evangélicas são estado de bem-estar social informal"

Em entrevista à DW Brasil, antropólogo Juliano Spyer aponta que elite brasileira tem uma visão "estereotipada e muito arrogante" sobre a realidade dos evangélicos, que podem superar número de católicos no país em 2032.

                Brasilianische Pfingstkirchler Evangelikalen Messe Ekstase

O Brasil vive o maior processo de transição religiosa do mundo, com sua população migrando de forma acelerada do catolicismo para o cristianismo evangélico. Se em 1970 os evangélicos representavam 5% dos brasileiros, hoje são cerca de um terço e, nesse ritmo, em 2032 serão a maioria.

Essa transformação tem impacto nas instituições e na vida das pessoas, especialmente dos mais pobres, mas é ainda pouco compreendida pela elite do país, afirma o antropólogo Juliano Spyer, autor do livro Povo de Deus: Quem são os evangélicos e por que eles importam, que chega às livrarias nesta semana pela Geração Editorial, com apresentação de Caetano Veloso.

A ideia da obra surgiu quando Spyer morava numa vila de trabalhadores na periferia de Salvador para a pesquisa de campo de seu doutorado, sobre uso das mídias sociais pelas classes baixas. Lá, fez amizade com famílias evangélicas, passou a frequentar cultos e percebeu o impacto prático que as relações construídas na igreja tinham na vida de pessoas vulneráveis e sem acesso a direitos e serviços públicos.

"Essas igrejas produzem um serviço que o Estado não dá conta ou para os quais a sociedade brasileira não se mobiliza. (…) Há uma rede de ajuda mútua: quando o marido fica desempregado e se arruma emprego, o filho se envolve com drogas e encontra um lugar para ser tratado, o marido que batia na mulher encontra caminhos para negociar uma harmonia em casa. É um estado de bem-estar social informal", diz.

Spyer afirma que a elite brasileira tem uma visão "estereotipada, pouco esclarecida e muito arrogante" sobre os evangélicos, que se reflete também em parte da classe política, inclusive na centro-esquerda. Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro, que teve entre os evangélicos sua maior vantagem eleitoral em 2018, adota uma estratégia "oportunista" de aproximação desse grupo, sinalizando que "se as outras pessoas não se interessam por eles, ele se interessa", diz o antropólogo.

DW Brasil: Como foi morar numa vila na periferia de Salvador de abril de 2013 a agosto de 2014 durante o doutorado?

Juliano Spyer: Sou um brasileiro branco, de classe média, ex-estudante da USP, a quem foi dada a oportunidade de fazer um programa de doutorado [no Reino Unido]. Precisava escolher um lugar [para a pesquisa de campo] e fui para um povoado no limite da área metropolitana de Salvador, numa vila de trabalhadores na Costa dos Coqueiros. Tive a oportunidade de encontrar um país que, nos documentos, é o meu, mas no qual eu nunca tinha vivido. A antropóloga americana Cláudia Fonseca, que vive no Brasil, disse que a divisão racial e por classe no Brasil é semelhante à da África do Sul no apartheid, mas se mantém e é silenciosa.

E por que decidiu pesquisar os evangélicos?

A antropologia do cristianismo é um dos principais temas da antropologia contemporânea. O Brasil pobre, principalmente na área urbana, é predominantemente evangélico. Não existe no mundo uma transição religiosa acontecendo como a do nosso país, que é o maior país católico do mundo e está se tornando um dos maiores países protestantes do mundo.

Em 1970 havia 5% de evangélicos, incluindo protestantes. Em 2000 eram 22%, e no ano passado era um terço da população acima de 16 anos. Os estatísticos preveem que em 2032 o cristianismo evangélico se tornará a religião predominante no país.

Isso afeta todo mundo. Por um lado, muitas igrejas evangélicas se deram conta de que, para influenciar nas pautas de comportamento, elas precisam se envolver com o governo. Mas existe um lado B, que é o efeito da igreja na vida das pessoas. [Na vila em Salvador] a gente convivia com a violência doméstica, ouvia gritos, e não adiantava chamar a polícia. Uma das primeiras consequências da conversão [ao cristianismo evangélico] era acabar com isso. A conversão também é um ato inteligente, e não apenas de fé, que traz benefícios à vida do brasileiro mais pobre.

No final dos 18 meses, descobri que várias das pessoas da igreja evangélica com quem me relacionava haviam participado de organizações criminosas e sido presas. E eram ótimos pais, esforçados, generosos. É a principal maneira para reinserir na sociedade pessoas que estiveram envolvidas com violência.

Sem desprezar os muitos problemas de ordem moral, temos que considerar o quanto essas igrejas produzem um serviço que o Estado não dá conta ou para os quais a sociedade brasileira não se mobiliza. A motivação desse livro é falar, para as pessoas do meu círculo, que existe muito mais complexidade e valores a serem levados em conta em relação a esse fenômeno.

No mapa das religiões, o que é o cristianismo evangélico?

Evangélico é um termo disputado. Precisamos usá-lo porque eles se reconhecem dessa forma entre si e em relação aos outros. Agora, se você vai ao Nordeste, evangélico é todo mundo que é protestante, inclusive do protestantismo histórico, como os luteranos e os calvinistas. No Sul, esses grupos se diferenciam. Mas há um grau de convergência, são todos protestantes e vieram do mesmo movimento contestador do Lutero.

São predominantemente conservadores no âmbito moral, mas há igrejas que relativizam isso, como a Bola de Neve. O [ginasta] Diego Hypólito, por exemplo, atleta brasileiro nas Olimpíadas, se assumiu homossexual e é dessa igreja. O que diferencia o pentecostalismo é ser uma religiosidade feita pelo povo, comunicada de uma maneira simples e que trata das questões deles do dia a dia. Isso se espalhou como fogo dentro do Brasil popular.

Por que o cristianismo evangélico teve tanta aderência nas camadas populares?

Segundo o antropólogo Gilberto Velho, o principal fenômeno social brasileiro do século 20 é a migração de nordestinos em massa para as capitais ao sul. Ao chegar nessas cidades do sul, eles ocuparam regiões periféricas, desprovidas de tudo, inclusive de Igreja Católica. São originalmente católicos, mas não têm garantias de trabalho, transporte, vivem em condições ruins de moradia, se desprendem das raízes familiares.

E nessa igreja você dá voz à sua religiosidade profunda, é ouvido como pessoa, não como número ou funcionário, põe para fora suas inquietações, frustrações e dores. Além disso, há uma rede de ajuda mútua: quando o marido fica desempregado e se arruma emprego, o filho se envolve com drogas e encontra um lugar para ser tratado, o marido que batia na mulher encontra caminhos para negociar uma harmonia em casa. É um estado de bem-estar social informal.

Esse cristianismo tem consequência direta na estabilização da vida de pessoas em situação de vulnerabilidade. Mas hoje você encontra também igrejas evangélicas em bairros mais luxuosos das capitais.

Jesus Parade in Sao Paulo

Marcha para Jesus, em São Paulo. No atual ritmo de crescimento, evangélicos serão maioria em 2032

Como as classes média-alta e alta em geral veem os evangélicos?

Têm uma visão estereotipada, pouco esclarecida e muito arrogante. Veem ou como o evangélico do mal, o sujeito manipulador da fé que ganha dinheiro e se usa da ingenuidade popular, ou como o evangélico do bem, o coitadinho que precisou se apegar a isso. Mesmo quando se tem uma visão benigna, é prepotente.

Isso se reflete na cobertura da imprensa sobre os evangélicos?

Há uma disputa pelo acesso a camadas populares entre os grupos que controlam a comunicação no Brasil, de grupos de um mundo mais aristocrático, católico, em relação a grupos pentecostais, sendo a TV Record o principal deles. Parte do desinteresse ou falta de generosidade para tratar desse assunto se dá por uma disputa no âmbito da indústria da comunicação.

No livro, cito como a data dos 500 anos da Reforma Protestante foi anunciada no Jornal Nacional [em 2017]. Ele fala de Lutero, do Calvino, da fundação da primeira igreja protestante no Brasil, mostram uma celebração numa igreja protestante histórica, predominantemente branca no Rio de Janeiro, e os luteranos no Sul do país. Não entra um evangélico, como se o assunto não existisse. Sendo que a Assembleia de Deus, maior igreja evangélica do Brasil, foi fundada por missionários suecos batistas e eles se consideram protestantes.

Os evangélicos são mais conservadores do que o resto da população?

Sim e não. Se você pensar nos bolsões de prosperidade de pessoas que têm estudo superior, os evangélicos são realmente mais conservadores. Mas se você considerar o Brasil popular, há um senso de conservadorismo em relação a valores. Nos primeiros 400 anos do Brasil não dá para separá-lo do catolicismo, e de um catolicismo conservador. Esse conjunto de valores em relação às pautas de gênero, sexual, LGBT não é estritamente pentecostal, mas se desdobra no catolicismo e no espiritismo.

O grupo religioso que mais deu vantagem de votos a Bolsonaro na eleição de 2018 foi os evangélicos. Por que isso ocorreu

Concordo com um argumento levantado pelo cientista político Mark Lilla, de Columbia, em que ele fala que o sucesso da eleição do [Donald] Trump se deu pela incapacidade da adversária naquele momento, a senadora Hillary Clinton, de conversar com diferentes.

No Brasil, de um lado você tem um governo que demonstra respeito pelos valores dessa população [evangélica]. E do outro lado tinha o outro candidato, Fernando Haddad. Não sou antipetista e não falo isso como crítica pessoal, mas ele cometeu um erro ao chamar o bispo Edir Macedo de charlatão. Havia mulheres da Igreja Universal batalhando dentro dos seus espaços de culto para defender um candidato que era alternativa ao Bolsonaro que, com essa declaração, perderam essa possibilidade, pelo argumento de "como votar em alguém que nos desrespeita".

A alternativa é entender mais sobre o assunto e fazer uma negociação na qual não vai se concordar em todos os pontos, mas não irá demonizar a pessoa. O fato de eu escrever um livro que é empático [aos evangélicos] não significa que eu concordo com a maior parte das questões que eles defendem em relação a questões morais, mas quero dizer que não é só isso que deve ser considerado.

Bolsonaro afirma que até o final de seu mandato nomeará um ministro ao Supremo que seja "terrivelmente evangélico". Como o senhor interpreta essa fala?

Há uma ação oportunista do Bolsonaro para se aproximar de um grupo que é largamente desconhecido e rejeitado automaticamente pelo outro campo. O presidente sinaliza para esse grupo que, se as outras pessoas não se interessam por eles, ele, sim, se interessa.

A ministra da Mulher, Família, Direitos Humanos, Damares Alves, é uma das vozes radicais no governo na pauta moral. O quanto ela representa os evangélicos?

Há pessoas no meio evangélico simpáticas à ministra Damares, mas também há pessoas no meio evangélico simpáticas a pessoas como a [deputada federal pelo PT-RJ] Benedita da Silva e a Marina Silva, que são da Assembleia de Deus. Assim como a Damares, há outros evangélicos no governo que são repudiados ou motivo de vergonha para alguns grupos evangélicos.

Além disso, o ambiente na igreja evangélica é politizado, no sentido de questionar qual é o interesse do pastor quando ele traz tal pessoa, ou por que o pastor propõe algo ou está conversando com tal político. Foi aplicado um questionário em 2018 durante a Marcha para Jesus e um dos achados foi que a maior parte dos evangélicos ali não votava no candidato indicado pelos líderes da igreja.

E a bancada evangélica, representa a diversidade do cristianismo evangélico? Há instrumentalização da religião para ampliar o poder político?

Ela é representativa de muitos evangélicos, conta com representantes de muitas outras igrejas. Mas a Marina Silva não fazia parte dessa bancada e é evangélica.

Isso não impede que se faça uma crítica justa à utilização de estruturas da igreja para ter uma presença cada vez maior dentro do Estado e, a partir dessa presença, impor visões que são diferentes das visões dos evangélicos. Até pouco tempo, o cristianismo evangélico, como herdeiro da tradição protestante, sempre foi defensor da liberdade de culto.

Neste momento há uma sobreposição de canais, em que as igrejas são instrumentalizadas para eleger pessoas que depois deixam de ter responsabilidade com seus eleitores, mas somente com os donos dessas igrejas. É uma questão séria, que precisa ser considerada enquanto se estabelece diálogo com os evangélicos comuns, e não esperar até a eleição para então fazer um acordo de conveniência com o dono de uma igreja.

 

Fonte: https://www.dw.com

 


 

               

 


Johannes Janzen


Postado em 22/10/2016

 

 



John Lennox, nasceu na Irlanda do Norte.

É professor de matemática na Universidade de Oxford.

Cristão, é também um estudioso das relações entre ciência e religião.

Publicou vários livros e participa de debates públicos sobre o assunto.

Em 2009, Herton Escobar, do O Estadao de S.Paulo, entrevistou John Lennox. Reproduzo a entrevista a seguir.

***
Se Deus criou o universo, quem criou Deus?

A pergunta é "absurda", diz o matemático John Lennox, da Universidade de Oxford, na Inglaterra. "Deus é eterno; ele não foi criado, sempre existiu", afirma o professor, enfático. "A única razão pela qual alguém pode perguntar isso é para dizer que não há realidade definitiva. Quem criou o Deus, que criou o Deus, que criou o Deus? Vamos retroceder no tempo para sempre."

Lennox é um dos notáveis defensores do "design inteligente", teoria que combina conceitos científicos e teológicos para explicar a origem do universo e a evolução da vida na Terra. Ele foi o convidado de honra do simpósio Darwinismo Hoje, organizado neste mês pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo - cujo colégio ensina o design nas aulas de ciência.

O professor, cristão, de origem irlandesa, faz questão de dizer que o design inteligente não é só um "criacionismo disfarçado". Segundo ele, suas opiniões são baseadas em lógicas científicas que demonstram a existência de Deus. Ele é um forte crítico do biólogo Richard Dawkins, seu "colega" de Oxford e autor de Deus, uma Ilusão, para quem a evolução darwiniana é suficiente para explicar a vida na Terra.

"Dawkins acha que ele foi criado pelo universo. Então eu pergunto: Quem criou o criador dele?", rebate Lennox. "Viu só? A pergunta funciona para os dois lados." A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Estado.

Como o senhor contaria a história do universo, com base no design inteligente?

Bem, no início, Deus criou o mundo. Quando isso aconteceu, eu não sei. A Bíblia não diz. A melhor estimativa hoje é em torno de 13 bilhões de anos atrás. Não vejo problema com isso. A descrição científica do universo se expandindo a partir de um ponto inicial é fascinante, porque foi só a partir dos anos 60 que os físicos começaram a falar nisso. Por séculos, eles aceitaram a versão de Aristóteles, de que o universo sempre existiu. Mas a Bíblia sempre disse que houve um início. É o que eu chamo de convergência. Ciência e teologia buscam respostas para perguntas muito diferentes, mas não totalmente diferentes.

Então o senhor não vê conflito entre a ciência do Big Bang e a teologia da Criação?

Não. O que o Big Bang nos diz é que houve um início, representado por uma singularidade (um ponto de massa e densidade infinitas). O que os cientistas fazem é apontar para trás e dizer sinto muito, não posso ir além desse ponto, porque aqui as leis da física deixam de funcionar. A pergunta lógica que se faz é: qual é a causa dessa singularidade? Aí entram as Escrituras e dizem: Deus é responsável. Isso não é anticiência, é algo que faz sentido.

Mas a mesma pergunta pode ser feita sobre Deus: Se ele criou o universo, quem criou Deus?

Se você me pergunta isso, significa que você pensa em Deus como algo que foi criado. A maioria de nós (cristãos) nunca acreditou nisso. A pergunta que não quer calar é outra, muito mais profunda: existe algo eterno, que nunca foi criado? Deus é eterno, segundo a fé cristã; ele não foi criado, sempre existiu. Perguntar quem o criou é absurdo. E o que dizer sobre a matéria e a energia? Os materialistas acreditam que elas são eternas. De ambos os lados do debate há uma realidade definitiva. Para mim, essa realidade é Deus. Para o materialista, é matéria e energia. Então, não venha discutir comigo sobre quem criou Deus. A verdadeira pergunta que devemos fazer é: Para que lado apontam as evidências?

O que diz o design inteligente?

É importante contextualizar isso, porque estou cansado das interpretações equivocadas que são feitas. A pergunta que está na base do assim chamado "movimento do design inteligente" é esta: há evidências científicas de que o universo não é um sistema fechado; de que houve um input de inteligência na sua criação? O que buscamos fazer com isso é separar a questão científica da questão teológica. Imagine o seguinte: você e eu voamos para Marte e encontramos lá várias pilhas de cubos de titânio. A primeira pilha tem 2 cubos, a segunda 3, depois 5, 7, 11, 13 e assim por diante, seguindo a ordem de números primos. O que você acharia disso? Certamente alguém esteve lá antes de nós, mas quem? Podemos concluir que aquilo é um arranjo inteligente, mesmo sem saber a identidade da inteligência que o criou. Agora, você acha que o fato do universo ser inteligível é evidência do quê? De uma inteligência superior que o criou, ou de um processo aleatório e despropositado?

Como é que a evolução se encaixa nesse modelo?

Temos de ter cuidado aqui, pois a palavra evolução é como a palavra criacionismo; ela pode ter várias definições, e não vejo problema com algumas delas. Não vejo problema com o que Darwin observou. Ele foi um gênio! A seleção natural faz algumas coisas, como mudar bicos de pássaros e coisas assim. O erro está em acreditar que a evolução faz tudo. A evolução pressupõe a existência de um organismo replicador mutante. Ela não pode explicar a existência daquilo que é mutado, não pode explicar a origem da vida. Não estou dizendo que processos naturais não estão envolvidos; estou dizendo que a inteligência tem de estar envolvida desde o início. Se você define a natureza como aquilo que a física e a química podem fazer, a vida parece ser algo sobrenatural. Processos naturais são ótimos para transmitir informação, mas não para criar informação.

O senhor acredita que Deus criou uma única forma de vida primordial, da qual todos os seres vivos evoluíram, ou que todas as espécies foram criadas por Deus da maneira como existem hoje?

Não quero ser dogmático sobre isso. Nós já conversamos sobre a singularidade que existia na origem do universo. Os físicos concordam que houve um início, então eles estão em acordo com a Bíblia nesse aspecto. No primeiro capítulo da Bíblia está escrito: "E Deus disse: faça-se a luz." Então eu imagino que Deus falou e criou o universo. Depois ele falou de novo, e houve outras singularidades. Talvez uma delas tenha sido a criação da vida.

Mas o que foi criado exatamente? Vou colocar a pergunta de outra forma: O senhor acredita na ancestralidade comum de todos os seres vivos, como propõe Darwin?

Ora, isso está sendo disputado profundamente pelos cientistas nesse momento. Não sou geneticista, mas estou muito impressionado com as novas argumentações que estão surgindo nessa área. Elas mostram que a árvore da vida está morta. O que eu acredito é que houve pontos específicos na história em que Deus introduziu coisas novas, que não podem ser explicadas apenas pelos processos naturais que já estavam em curso. Os momentos mais importantes foram a criação do universo, da vida biológica e da vida humana. Não acredito que os seres humanos evoluíram de alguma forma animal, puramente por processos naturais.

O ser humano, então, seria uma singularidade criada por Deus, como o universo? Ele foi criado da forma como existe hoje?

Isso é o que eu acredito. O que você teria visto se estivesse lá no momento da criação, eu não sei dizer. O que sei é que os seres humanos são seres únicos em toda a Criação. A Bíblia diz que eles foram feitos à imagem de Deus. Em resumo, minha atitude é muito simples: sem Deus, não se pode chegar do nada a alguma coisa. Sem Deus, não se pode chegar do material ao vivo. Sem Deus, não se pode chegar do animal ao humano. Acredito nisso não por uma questão de fé, mas porque é o que as evidências me levam a crer.

É justo que um materialista, como o senhor diz, exija provas de que Deus existe para acreditar nele?

Sem dúvida, desde que você me explique o que quer dizer por "provas". Eu trabalho numa área - a matemática - em que "prova" tem um significado muito específico. É claro que eu não posso provar matematicamente que Deus existe. Mas eu posso dar evidências e fazer uma argumentação com base na ciência e em outras disciplinas. Assim como não posso provar que minha mulher me ama, mas tenho muitas evidências disso. Richard Dawkins diz que ter fé é acreditar em algo sobre o qual não há provas. Mas isso é a definição dele. Isso é fé cega. Eu sou um cristão, e a fé cristã é o oposto da cegueira. Ela é baseada em evidências, como a ressurreição de Cristo, sobre a qual há evidências históricas, diretas e indiretas.

CRIAÇÃO: "Os físicos concordam que houve um início, então eles estão em acordo com a Bíblia nesse aspecto"

DÚVIDA: "A pergunta que não quer calar é outra, muito mais profunda: existe algo eterno, que nunca foi criado?"

EVOLUÇÃO: "Ela não pode explicar a existência daquilo que é mutado, não pode explicar a origem da vida"

 

Fonte: http://www.origemedestino.org.br

 

 


 

“É possível acreditar em Deus usando a razão”, afirma William Lane Craig

O filósofo e teólogo defende o cristianismo, a ressurreição de Jesus e a veracidade da Bíblia a partir de construção lógica e racional, e se destaca em debates com pensadores ateus

Postado em 22/10/2016

 

“Se você acha que a religião é um conto de fadas, não acredite. Mas se o cristianismo é a verdade – como penso que é – temos que acreditar nele independente das consequências. É o que as pessoas racionais fazem, elas acreditam na verdade. A via contrária é o pragmatismo. ‘Isso Funciona? Não importa se é verdade, quero saber se funciona'”

William Lane Craig

Quando o escritor britânico Christopher Hitchens, um dos maiores defensores do ateísmo, travou um longo debate nos Estados Unidos, em abril de 2009, com o filósofo e teólogo William Lane Craig sobre a existência de Deus, seus colegas ateus ficaram tensos. Momentos antes de subir ao palco, Hitchens – que morreu em dezembro de 2011. aos 62 anos – falou a jornalistas sobre a expectativa de enfrentar Craig.

“Posso dizer que meus colegas ateus o levam bem a sério”, disse. “Ele é considerado um adversário muito duro, rigoroso, culto e formidável”, continuou. “Normalmente as pessoas não me dizem ‘boa sorte’ ou ‘não nos decepcione’ antes de um debate – mas hoje, é o tipo de coisa que estão me dizendo”. Difícil saber se houve um vencedor do debate. O certo é que Craig se destaca pela elegância com que apresenta seus argumentos, mesmo quando submetido ao fogo cerrado.

O teólogo evangélico é considerado um dos maiores defensores da doutrina cristã na atualidade. Craig, que vive em Atlanta (EUA) com a esposa, sustenta que a existência de Deus e a ressurreição de Jesus, por exemplo, não são apenas questões de fé, mas passíveis de prova lógica e racional. Em seu currículo de debates estão o famoso químico e autor britânico Peter Atkins e o neurocientista americano Sam Harris (veja lista com vídeos legendados de Craig). Basta uma rápida procura no Youtube para encontrar uma vastidão de debates travados entre Craig e diversos estudiosos. Richard Dawkins, um dos maiores críticos do teísmo, ainda se recusa a discutir com Craig sobre a existência de Deus.

Em artigo publicado no jornal inglês The Guardian, Dawkins afirma que Craig faz apologia ao genocídio, por defender passagens da Bíblia que justificam a morte de homens, mulheres e crianças por meio de ordens divinas. “Vocês apertariam a mão de um homem que escreve esse tipo de coisa? Vocês compartilhariam o mesmo palco que ele? Eu não, eu me recuso”, escreveu. Na entrevista abaixo, Craig fala sobre o assunto.

Autor de diversos livros – entre eles Em Guarda – Defenda a fé cristã com razão e precisão (Ed. Vida Nova), lançado no fim de 2011 no Brasil, – Craig é doutor em filosofia pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra, e em teologia pela Universidade de Munique, Alemanha. O filósofo esteve no Brasil para o 8º Congresso de Teologia da Editora Vida Nova, em Águas de Lindóia, entre 13 e 16 de março. Durante o simpósio, Craig deu palestras e dedicou a última apresentação a atacar, ponto a ponto, os argumentos de Richard Dawkins sobre a inexistência de Deus.

Perfil

Nome: William Lane Craig

Profissão: Filósofo, teólogo e professor universitário na Universidade de Biola, Califórnia

Nascimento: 23 de agosto de 1949

Livros destacados: Apologética Contemporânea – A veracidade da Fé Cristã; Em Guarda, Defenda a fé cristã com razão e precisão; ambos publicados no Brasil pela editora Vida Nova

Principal contribuição para a filosofia: Craig foi responsável por reformular o Argumento Cosmológico Kalam (variação do argumento cosmológico que defende a existência de uma primeira causa para o universo) nos seguintes termos: 1) Tudo que começa a existir tem uma causa de existência. 2) O universo começou a existir. 3) Portanto, o universo tem uma causa para sua existência.

Informações pessoais: William Lane Craig é conhecido pelo trabalho na filosofia do tempo e na filosofia da religião, especificamente sobre a existência de Deus e na defesa do teísmo cristão. Escreveu e editou mais de 30 livros, é doutor em filosofia e teologia em universidades inglesa e alemã e desde 1996 é pesquisador e professor de filosofia na Universidade de Biola, na Califórnia. Atualmente vive em Atlanta, nos EUA, com a esposa. Craig pratica exercícios regularmente como forma de combater a APM (Atrofia Peronial Muscular) uma doença degenerativa do sistema nervoso que lhe causou atrofiamento dos nervos das mãos e pernas. Especialista em debates desde o ensino médio, o filósofo passa a maior parte do tempo estudando.

Por que deveríamos acreditar em Deus? Porque os argumentos e evidências que apontam para a Sua existência são mais plausíveis do que aqueles que apontam para a negação. Vários argumentos dão força à ideia de que Deus existe. Ele é a melhor explicação para a existência de tudo a partir de um momento no passado finito, e também a para o ajuste preciso do universo, levando ao surgimento de vida inteligente. Deus também é a melhor explicação para a existência de deveres e valores morais objetivos no mundo. Com isso, quero dizer valores e deveres que existem independentemente da opinião humana.

Se Deus é bondade e justiça, por que ele não criou um universo perfeito onde todas as pessoas vivem felizes? Acho que esse é o desejo de Deus. É o que a Bíblia ensina. O fato de que o desejo de Deus não é realizado implica que os seres humanos possuem livre-arbítrio. Não concordo com os teólogos que dizem que Deus determina quem é salvo ou não. Parece-me que os próprios humanos determinam isso. A única razão pela qual algumas pessoas não são salvas é porque elas próprias rejeitam livremente a vontade de Deus de salvá-las.

Alguns cientistas argumentam que o livre-arbítrio não existe. Se esse for o caso, as pessoas poderiam ser julgadas por Deus? Não, elas não poderiam. Acredito que esses autores estão errados. É difícil entender como a concepção do determinismo pode ser racional. Se acreditarmos que tudo é determinado, então até a crença no determinismo foi determinada. Nesse contexto, não se chega a essa conclusão por reflexão racional. Ela seria tão natural e inevitável como um dente que nasce ou uma árvore que dá galhos. Penso que o determinismo, racionalmente, não passa de absurdo. Não é possível acreditar racionalmente nele. Portanto, a atitude racional é negá-lo e acreditar que existe o livre-arbítrio.

O senhor defende em seu site uma passagem do Velho Testamento em que Deus ordena a destruição da cidade de Canaã, inclusive autorizando o genocídio, argumentando que os inocentes mortos nesse massacre seriam salvos pela graça divina. Esse não é um argumento perigosamente próximo daqueles usados por terroristas motivados pela religião? A teoria ética desses terroristas não está errada. Isso, contudo, não quer dizer que eles estão certos. O problema é a crença deles no deus errado. O verdadeiro Deus não ordena atos terroristas e, portanto, eles estariam cometendo uma atrocidade moral. Quero dizer que se Deus decide tirar a vida de uma pessoa inocente, especialmente uma criança, a Sua graça se estende a ela.

Se o terrorista é cristão o ato terrorista motivado pela religião é justificável, por ele acreditar no Deus ‘certo’? Não é suficiente acreditar no deus certo. É preciso garantir que os comandos divinos estão sendo corretamente interpretados. Não acho que Deus dê esse tipo de comando hoje em dia. Os casos do Velho Testamento, como a conquista de Canaã, não representam a vontade normal de Deus.

O sr. está querendo dizer que Deus também está sujeito a variações de humor? Não é plausível esperar que pelo menos Ele seja consistente? Penso que Deus pode fazer exceções aos comandos morais que dá. O principal exemplo no Velho Testamento é a ordem que ele dá a Abraão para sacrificar seu filho Isaque. Se Abraão tivesse feito isso por iniciativa própria, isso seria uma abominação. O deus do Velho Testamento condena o sacrifício infantil. Essa foi uma das razões que o levou a ordenar a destruição das nações pagãs ao redor de Israel. Elas estavam sacrificando crianças aos seus deuses. E, no entanto, Deus dá essa ordem extraordinária a Abraão: sacrificar o próprio filho Isaque. Isso serviu para verificar a obediência e fé dele. Mas isso é a exceção que prova a regra. Não é a forma normal com que Deus conduz os assuntos humanos. Mas porque Deus é Deus, Ele tem a possibilidade de abrir exceções em alguns casos extremos, como esse.

O sr. disse que não é suficiente ter o deus certo, é preciso fazer a interpretação correta dos comandos divinos. Como garantir que a sua interpretação é objetivamente correta? As coisas que digo são baseadas no que Deus nos deu a conhecer sobre si mesmo e em preceitos registrados na Bíblia, que é a palavra d’Ele. Refiro-me a determinações sobre a vida humana, como “não matarás”. Deus condena o sacrifício de crianças, Seu desejo é que amemos uns ao outros. Essa é a Sua moral geral. Seria apenas em casos excepcionalmente extremos, como o de Abraão e Isaque, que Deus mudaria isso. Se eu achar que Deus me comandou a fazer algo que é contra o Seu desejo moral geral, revelado na escritura, o mais provável é que eu tenha entendido errado. Temos a revelação do desejo moral de Deus e é assim que devemos nos comportar.

O sr. deposita grande parte da sua argumentação no conteúdo da Bíblia. Contudo, ela foi escrita por homens em um período restrito, em uma área restrita do mundo, em uma língua restrita, para um grupo específico de pessoas. Que evidência se tem de que a Bíblia é a palavra de um ser sobrenatural? A razão pela qual acreditamos na Bíblia e sua validade é porque acreditamos em Cristo. Ele considerava as escrituras hebraicas como a palavra de Deus. Seus ensinamentos são extensões do que é ensinado no Velho Testamento. Os ensinamentos de Jesus são direcionados à era da Igreja, que o sucederia. A questão, então, se torna a seguinte: temos boas razões para acreditar em Jesus? Ele é quem ele diz ser, a revelação de Deus? Acredito que sim. A ressurreição dos mortos, por exemplo, mostra que ele era quem afirmava.

Existem provas que confirmem a ressurreição de Jesus? Temos boas bases históricas. A palavra ‘prova’ pode ser enganosa porque muitos a associam com matemática. Certamente, não temos prova matemática de qualquer coisa que tenha acontecido na história do homem. Não temos provas, nesse sentido, de que Júlio César foi assassinado no senado romano, por exemplo, mas temos boas bases históricas para isso. Meu argumento é que se você considera os documentos do Novo Testamento como fontes da história antiga, – como os historiadores gregos Tácito, Heródoto ou Tucídides – o evangelho aparece como uma fonte histórica muito confiável para a vida de Jesus de Nazaré. A maioria dos historiadores do Novo Testamento concorda com os fatos fundamentais que balizam a inferência sobre a ressurreição de Cristo. Coisas como a sua execução sob autoridade romana, a descoberta das tumbas vazias por um grupo de mulheres no domingo depois da crucificação e o relato de vários indivíduos e grupos sobre os aparecimentos de Jesus vivo após sua execução. Com isso, nos resta a seguinte pergunta: qual é a melhor explicação para essa sequência de acontecimentos? Penso que a melhor explicação é aquela que os discípulos originais deram – Deus fez Jesus renascer dos mortos. Não podemos falar de uma prova, mas podemos levantar boas bases históricas para dizer que a ressurreição é a melhor explicação para os fatos. E como temos boas razões para acreditar que Cristo era quem dizia ser, portanto temos boas razões para acreditar que seus ensinamentos eram verdade. Sendo assim, podemos ver que a Bíblia não foi criação contingente de um tempo, de um lugar e de certas pessoas, mas é a palavra de Deus para a humanidade.

O textos da Bíblia passaram por diversas revisões ao longo do tempo. Como podemos ter certeza de que as informações às quais temos acesso hoje são as mesmas escritas há 2.000 anos? Além disso, como lidar com o fato de que informações podem ser perdidas durante a tradução? Você tem razão quanto a variedade de revisões e traduções. Por isso, é imperativo voltar às línguas originais nas quais esses textos foram escritos. Hoje, os críticos textuais comparam diferentes manuscritos antigos de modo a reconstruir o que os originais diziam. O Novo Testamento é o livro mais atestado da história antiga, seja em termos de manuscritos encontrados ou em termos de quão próximos eles estão da data original de escrita. Os textos já foram reconstruídos com 99% de precisão em relação aos originais. As incertezas que restam são trivialidades. Por exemplo, na Primeira Epístola de João, ele diz: “Estas coisas vos escrevemos, para que o vosso gozo se cumpra”. Mas alguns manuscritos dizem: “Estas coisas vos escrevemos, para que o nosso gozo se cumpra”. Não temos certeza se o texto original diz ‘vosso’ ou ‘nosso’. Isso ilustra como esse 1% de incerteza é trivial. Alguém que realmente queira entender os textos deverá aprender grego, a língua original em que o Novo Testamento foi escrito. Contudo, as pessoas também podem comprar diferentes traduções e compará-las para perceber como o texto se comporta em diferentes versões.

É possível explicar a existência de Deus apenas com a razão? Qual o papel da ciência na explicação das causas do universo? A razão é muito mais ampla do que a ciência. A ciência é uma exploração do mundo físico e natural. A razão, por outro lado, inclui elementos como a lógica, a matemática, a metafísica, a ética, a psicologia e assim por diante. Parte da cegueira de cientistas naturalistas, como Richard Dawkins, é que eles são culpados de algo chamado ‘cientismo’. Como se a ciência fosse a única fonte da verdade. Não acho que podemos explicar Deus em sua plenitude, mas a razão é suficiente para justificar a conclusão de que um criador transcendente do universo existe e é a fonte absoluta de bondade moral.

Por que o cristianismo deveria ser mais importante do que outras religiões que ensinam as mesmas questões fundamentais, como o amor e a caridade? As pessoas não entendem o que é o cristianismo. É por isso que alguns ficam tão ofendidos quando se prega que Jesus é a única forma de salvação. Elas pensam que ser cristão é seguir os ensinamentos éticos de Jesus, como amar ao próximo como a si mesmo. É claro que não é preciso acreditar em Jesus para se fazer isso. Isso não é o cristianismo. O evangelho diz que somos moralmente culpados perante Deus. Espiritualmente, somos separados d’Ele. É por isso que precisamos experimentar Seu perdão e graça. Para isso, é preciso ter um substituto que pague a pena dos nossos pecados. Jesus ofereceu a própria vida como sacrifício por nós. Ao aceitar o que ele fez em nosso nome, podemos ter o perdão de Deus e a limpeza moral. A partir disso, nossa relação com Deus pode ser restaurada. Isso evidencia por que acreditar em Cristo é tão importante. Repudiá-lo é rejeitar a graça de Deus e permanecer espiritualmente separado d’Ele. Se você morre nessa condição você ficará eternamente separado de Deus. Outras religiões não ensinam a mesma coisa.

A crença em Deus é necessária para trazer qualidade de vida e felicidade? Penso que a crença em Deus ajuda, mas não é necessária. Ela pode lhe dar uma fundação para valores morais, propósito de vida e esperança para o futuro. Contudo, se você quiser viver inconsistentemente, é possível ser um ateu feliz, contanto que não se pense nas implicações do ateísmo. Em última análise, o ateísmo prega que não existem valores morais objetivos, que tudo é uma ilusão, que não há propósito e significado para a vida e que somos um subproduto do acaso.

Por que importa se acreditamos no deus do cristianismo ou na ‘mãe natureza’ se na prática as pessoas podem seguir, fundamentalmente, os mesmos ensinamentos? Deveríamos acreditar em uma mentira se isso for bom para a sociedade? As pessoas devem acreditar em uma falsa teoria, só por causa dos benefícios sociais? Eu acho que não. Isso seria uma alucinação. Algumas pessoas passam a acreditar na religião por esse motivo. Já que a religião traz benefícios para a sociedade, mesmo que o indivíduo pense que ela não passa de um ‘conto de fadas’, ele passa a acreditar. Digo que não. Se você acha que a religião é um conto de fadas, não acredite. Mas se o cristianismo é a verdade – como penso que é – temos que acreditar nele independente das consequências. É o que as pessoas racionais fazem, elas acreditam na verdade. A via contrária é o pragmatismo. “Isso Funciona?”, perguntam elas. “Não importa se é verdade, quero saber se funciona”. Não estou preocupado se na Suécia alguns são felizes sem acreditar em Deus ou se há alguma vantagem em acreditar n’Ele. Como filósofo, estou interessado no que é verdade e me parece que a existência desse ser transcendente que criou e projetou o universo, fonte dos valores morais, é a verdade.

(Colaborou Gabriel Castro)

 

Fonte: http://veja.abril.com.br

 


 

Entrevista com R.T. Kendall

Qualquer manifestação do Espírito que não leve à convicção do pecado, a uma vida de santidade...


O pastor norte-americano Robert Tillman Kendall é um dos mais entusiastas pregadores do avivamento espiritual na atualidade. E ninguém pense que sua ênfase nos dons carismáticos é fruto de uma formação pentecostal apaixonada – teólogo reformado, egresso de escolas batistas e com doutorado em Filosofia, ele conta que teve uma experiência pessoal com o Espírito Santo há sessenta anos. Desde então, R.T. Kendall, como é conhecido mundialmente, pastoreou igrejas, produziu obras de referência e pregou o Evangelho – inclusive, na célebre Capela de Westminster, em Londres, onde foi ministro titular de 1977 a 2002. Ali, sucedeu no púlpito a ninguém menos do que o pregador britânico Martin Lloyd-Jones, um dos grandes nomes da fé evangélica no século 20. Dele, herdou o zelo pela Palavra de Deus e a paixão pela pregação expositiva, além do rigor na ortodoxia da mensagem. Aos 80 anos de idade, Kendall continua em plena atividade intelectual e ministerial. Seu livro Fogo santo (Faz Chover Produções), lançado recentemente no Brasil, faz uma análise esclarecedora e equilibrada sobre a contemporaneidade dos dons espirituais. O livro é um contraponto à obra Fogo estranho, do pregador batista John MacArthur, opositor declarado de Kendall. “Ele é uma espécie de disco quebrado. Eu não gostaria de estar em seu lugar, dadas as coisas horríveis que ele diz sobre tantas pessoas cheias do Espírito”, devolve. No Brasil pela primeira vez em setembro, Kendall, concedeu esta entrevista exclusiva a CRISTIANISMO HOJE:

CRISTIANISMO HOJE – Nunca é fácil substituir uma celebridade. Como foi, para o senhor, ocupar por 25 anos o púlpito que foi de Martyn Lloyd-Jones?

R.T. KENDALL – Não foi fácil, com certeza. Porém, Lloyd-Jones era o meu maior incentivador, além de ser um grande amigo. Ele desejava, mais do que qualquer pessoa, que eu fosse bem sucedido. Foi ele, portanto, quem mais me ajudou, colocando-me naquela posição e abrindo a sua própria casa para mim.

O senhor encontrou alguma resistência da congregação ao substituí-lo?

Não havia nenhuma dúvida ou queixa por parte da congregação, apenas de algumas pessoas de fora que, por algum motivo, não queriam que eu fosse pastor de lá. Eu apenas me esforcei para ser fiel na pregação da Palavra a cada semana. Ele me ensinou a compreender o texto em si – em outras palavras, a não atribuir um conceito ao texto, mas sim pregar aquilo que ele exige.

Em seus livros, o senhor insiste na importância da mensagem expositiva da Palavra de Deus. Qual é o valor desse tipo de pregação para a Igreja contemporânea e por que a abordagem direta das Escrituras está perdendo espaço?

Não há nada melhor do que um bom expositor da Bíblia e nada pior do que um ruim. Por mais que desejemos, nem todo pregador apresenta as Escrituras de forma expositiva. Há, no entanto, grandes pastores que não pregavam dessa maneira. Quando me tornei ministro da Capela de Westminster em 1977, eu já me sentia à vontade com esse tipo de pregação, e a congregação estava acostumada a isso. A maioria das igrejas não valoriza tanto esse tipo de pregação – e essa perda de espaço à qual você se referiu talvez aconteça porque poucos são bons nisso e porque muitas igrejas não possuem um apetite teológico por esse tipo de pregação. Chegou o tempo em que os ouvidos das pessoas “coçam” por ouvir aquilo que desejam dos pregadores – como a teologia da prosperidade, por exemplo, que incentiva as pessoas a fixarem seus olhos no dinheiro e em questões financeiras. Eu acredito que estamos vivendo nos últimos dias, em que há uma forma de santidade sem o verdadeiro poder do Espírito Santo. O que temos como consequência disso é uma igreja adormecida – exatamente como Jesus profetizou na parábola das dez virgens. Esses pregadores não falam nada sobre o pecado, a condenação eterna e a vida de santidade.

Quais são os maiores perigos que esses pregadores representam para suas congregações?

Em primeiro lugar, eles desviam as pessoas da mensagem do Evangelho. O Evangelho é o principal, o mais importante: a razão de Deus ter mandado seu Filho para morrer em uma cruz, ou seja, para que possamos ir para o céu, e não para o inferno. Em segundo lugar, eles evitam que as pessoas se fortaleçam em Deus somente, através da leitura da Bíblia e do consolo do Espírito Santo. As pessoas, normalmente, não conhecem as Escrituras. Em terceiro lugar, nós sabemos que a Bíblia é a Palavra de Deus através do testemunho interno do Espírito Santo. Em quarto, eles impedem que as pessoas ouçam a pregação da Palavra de Deus. Eu receio que esses pastores-terapeutas não sejam pregadores de verdade, mas sim, uma espécie de psicólogos que abordam os desejos, e não as necessidades do povo de Deus.

Em sua opinião, quais são os principais argumentos doutrinais e teológicos que provam a continuidade das manifestações espirituais nos dias de hoje, ao contrário do que dizem os cessacionistas?

O cessacionismo, crença de que os dons do Espírito cessaram com o fim da Igreja primitiva, é uma hipótese. Aqueles que escolhem crer nessa hipótese o fazem não porque ela é bíblica, mas porque oferece pretextos para que eles não creiam nos dons espirituais. Não existe uma única palavra nas Escrituras que dê respaldo ao cessacionismo. Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e para sempre, conforme Hebreus 13.8. Da mesma forma, o Espírito Santo é o mesmo ontem, hoje e para sempre. Qualquer pessoa imparcial que esteja disposta a seguir as evidências sabe que os milagres continuam acontecendo nos dias de hoje. Leia o trabalho de Craig Keener sobre milagres. Acompanhe o ministério de Randy Clark e as missões de Heidi Baker em Moçambique. Eu prevejo que, em um curto período de tempo, a hipótese cessacionista estará extinta no meio cristão, permanecendo apenas entre os ateus. Trata-se, na verdade, de deísmo com roupagens evangélicas. Ele está a um passo da descrença absoluta em Deus.

No Brasil, a demonstração excessiva de supostas manifestações espirituais, muitas vezes simuladas com objetivos fraudulentos, provocou um ceticismo generalizado – dentro e fora da igreja – em relação à autenticidade de dons como o falar em línguas e as profecias. Biblicamente, como seria possível identificar uma manifestação verdadeira do Espírito Santo?

Eu não estou qualificado para falar sobre a situação do Brasil, mas suspeito de que seja muito parecida com a que ocorre nos EUA em relação a alegações de curas falsas. Moisés descobriu, através de Faraó, que Satanás é capaz de produzir falsos milagres. Da mesma forma há, nos dias de hoje, charlatães que fazem o mesmo, prejudicando a imagem de homens e mulheres de Deus. Jonathan Edwards ensinava que, quando a igreja é reavivada, o diabo também é. Não deveríamos nos surpreender com a existência de falsos mestres e falsas profecias. Qualquer profecia que não seja coerente com a Palavra de Deus deve ser considerada falsa. E qualquer manifestação do Espírito que não leve à convicção do pecado, a uma vida de santidade e à glória de Deus deve ser vista como falsa.

A capacidade de falar em línguas é um sinal bíblico do revestimento de poder, como defendem os pentecostais?

Eu não acredito que isso seja evidência do batismo no Espírito Santo. O batismo no Espírito é a maior forma de garantia. É o que faz Deus e a salvação reais para as pessoas. O batismo no Espírito Santo é a porta de entrada para os dons espirituais e, também, para os frutos do Espírito. Os pentecostais têm a tendência de enfatizar os dons; os chamados protestantes tradicionais, os frutos. Nós precisamos dos dois – igualmente. Os dons do Espírito são irrevogáveis, conforme Romanos 11.29, ao passo que os frutos do Espírito não podem ser separados da nossa conduta ou das nossas atitudes pessoais.

O movimento pentecostal moderno teve origem com um grupo de pessoas sem formação teológica, espalhando-se dos EUA para o resto do mundo. Aqui no Brasil, ele foi identificado, durante muito tempo, com pessoas mais pobres e sem muita formação escolar. Em sua opinião, essa identificação social do movimento pentecostal com os pobres ainda existe?

Nunca devemos esquecer de que, na Igreja primitiva, Pedro e João não tinham uma educação formal, mas eles haviam estado com Jesus (Atos 4.13). Eu preferiria me juntar a gente assim do que a pessoas altamente educadas, mas que conhecem pouco do poder do Espírito. Eu incentivaria todas as pessoas a estudarem o máximo possível, contanto que isso não comprometa a autoridade e a infalibilidade da Bíblia para elas. Eu adquiri a minha formação através de um seminário bastante liberal, mas saí de lá mais forte do que quando entrei. Porém, também conheço muitas pessoas que abandonam sua fé quando expostas a duras críticas sobre as Escrituras e quando estudam filosofia moderna. Eu preferiria um milhão de vezes que tais pessoas fossem incultas, porém crentes na Palavra, do que tivessem doutorado mas se sentissem sofisticadas demais para falar em línguas. Nós precisamos de Pedro e João, mas também precisamos do apóstolo Paulo. Eu quero aprender o tempo todo, mas sem perder a capacidade de reconhecer a verdade. A maturidade teológica consiste, em parte, em saber que você ainda não a alcançou e que você estará sempre em busca da vontade e da glória de Deus.

O recente episódio em que o pastor John MacArthur foi confrontado no púlpito de sua igreja por um homem que se auto intitulou “profeta de Deus” e o criticou duramente por pregar o cessacionismo ganhou destaque no mundo inteiro. Para o senhor, o que motivou aquela atitude?

Eu achei esse incidente constrangedor. Aquele suposto profeta estava certo em sua posição doutrinária, porém errado na maneira como o abordou. Acho que, apesar da falta de sabedoria mostrada, Deus pode estar por trás disso, já que ele escolhe as coisas tolas deste mundo para confundir as sábias. Eu, no entanto, temo que o pastor a quem você se refere tenha se tornado incorrigível.

Quais são, em sua visão, os principais equívocos do livro Fogo estranho, de MacArthur?

Meu editor pediu que eu respondesse MacArthur. Eu só li Fogo estranho depois que meu livro já estava pronto; portanto, precisei escrever com base apenas no que imaginei que ele teria dito. Eu fiquei nervoso ao ler o seu livro por medo de ter deixado alguma coisa de fora. Quando, porém, o li, fiquei muito aliviado; eu não mudaria uma única palavra do meu livro. Eu acho que o autor de Fogo estranho é uma espécie de disco quebrado. Essa é a sua terceira tentativa de atacar os carismáticos. Ele está devendo muitas respostas; eu não gostaria de estar em seu lugar, dadas as coisas horríveis que ele diz sobre tantas pessoas cheias do Espírito. Um dos maiores equívocos do livro de MacArthur é que ele alega que o meu antecessor, o doutor Lloyd-Jones, concorda com ele nessa questão. Nada poderia estar mais distante da verdade. Eu dediquei um capítulo do meu livro à opinião de Lloyd-Jones a respeito do Espírito Santo. Eu acho que não devo aprofundar mais a minha resposta neste momento.

Como é a sua relação com o pastor John MacArthur?

Eu estive com ele apenas uma vez, no Texas, muitos anos atrás, quando pregamos na mesma conferência. Eu gostaria de ter desenvolvido um relacionamento com ele, mas ele parecia não querer o mesmo. Mas, ainda assim, eu espero que um dia ele responda à minha carta. Eu o respeito como mestre ortodoxo da Bíblia e acredito em muitas coisas sobre as quais ele prega. Não existe nenhum tipo de antagonismo pessoal entre nós – pelo menos, não de minha parte. Nós ainda teremos uma boa amizade no céu.

Neste momento da sua vida e ministério, quais são as tentações que o senhor enfrenta?

Eu estou com 80 anos. Porém, sendo totalmente sincero, as minhas tentações são as mesmas de cinquenta anos atrás – e se resumem a três coisas: dinheiro, sexo e poder. O amor ao dinheiro é a origem de todo o mal. Devemos ser completamente honestos quando se trata de dinheiro. Eu preciso estar disposto a permitir que qualquer pessoa veja quanto dinheiro entra em meu ministério e como cada centavo é gasto. Quanto ao sexo, todo cuidado é pouco em relação ao sexo oposto. Parece que o diabo consegue 75% dos melhores servos de Deus devido à falta de pureza sexual. É uma pena. Que tristeza! Já o poder refere-se principalmente ao orgulho – ou seja, pessoas que desejam o controle para construir impérios, ficar famosas. O melhor antídoto para essas três coisas é nos lembrarmos constantemente de que todos nós, em breve, estaremos diante do tribunal de Cristo para prestarmos conta das obras praticadas no corpo, quer sejam boas, quer sejam más (II Coríntios 5.10). Esse versículo é um lembrete amargo de que tudo o que for praticado em segredo será revelado. Isso deve ser o suficiente para que sejamos cuidadosos quando se trata de dinheiro, sexo e poder.

Que conselhos o senhor daria aos jovens pastores de hoje a respeito do uso equilibrado dos dons espirituais?

Diria uma única coisa: Enfatize os frutos do Espírito, conforme Paulo recomendou aos crentes de Éfeso. Porém, se nós tivéssemos que fazer uma escolha, a demonstração de perdão e a oração pelos nossos inimigos são mais importantes do que fazer as pessoas acreditarem nos dons do Espírito.

 

 


 

               Entrevista exclusiva com John Piper

O autor e teólogo vislumbra a falência do teísmo aberto e destaca a importância da pregação sobre o sacrifício de Cristo.


Adepto de uma teologia ortodoxa, defensor de posições que levam muitos a acusá-lo de fundamentalista e dono de um discurso bastante incisivo, John Stephen Piper é uma figura que se destaca numa época da história do cristianismo em que se tornou charmoso seguir o discurso heterodoxo da Igreja emergente, ostentar a crença no liberalismo teológico, manter um discurso baseado num amor divino água-com-açúcar ou mergulhar de cabeça na teologia da prosperidade. Esse posicionamento levou o pastor da Igreja Batista Bethlehem, em Minneapolis (EUA), a se tornar uma referência para os mais conservadores – e, simultaneamente, uma figura rejeitada pelos mais liberais, que o acusam de “não pregar o Evangelho do amor”.

Piper tem uma história de vida cheia de marcos dolorosos. Filho de um evangelista ausente, que viajava por todo o país plantando igrejas. Perdeu a mãe numa batida de ônibus. E, aos 60 anos, no dia de seu aniversário, recebeu a notícia de que estava com câncer de próstata – do qual se recuperou após uma cirurgia. Com 65 anos de idade, é casado com Noël Piper desde 1968, com quem tem quatro filhos, uma filha e um grupo grande de netos. Formado em Teologia pelo Wheaton College em 1968, tornou-se mestre em divindade pelo Fuller Theological Seminary três anos depois. O doutorado veio em 1974, em Estudos do Novo Testamento, na Universidade de Munique, na Alemanha. Seu ministério pastoral começou em 1980, após o que Piper define como “um chamado irresistível de Deus para pregar”. Por fim, ganhou notoriedade nacional e internacional após a publicação de seu livro Desiring God, originalmente chamado no Brasil de Teologia da alegria e posteriormente rebatizado de Em busca de Deus (Shedd Publicações).

Em 1994, Piper criou o ministério Desiring God, que, nas suas palavras, foi idealizado para “disseminar a paixão pela supremacia de Deus em todas as coisas para a alegria de todos os povos em Jesus Cristo”. A quem segue essa filosofia, Piper cunhou o termo “hedonista cristão”. Amado ou criticado, o conferencista, poeta e escritor de 37 livros tem sido uma voz que vem ecoando nos quatro cantos do chamado universo evangélico.

John Piper concedeu esta entrevista exclusiva a CRISTIANISMO HOJE, onde fala sobre assuntos que têm movimentado os debates teológicos e pastorais dos nossos dias. Temas com teísmo aberto, heterodoxia da fé e os efeitos da modernidade sobre o cristianismo, entre outros. E preferiu não responder a outras questões, como sua reação polêmica ao suposto universalismo do pastor emergente Rob Bell, considerada por muitos como falta de amor cristão.

 

CRISTIANISMO HOJE Depois da tragédia no Japão, em março, o senhor declarou que toda calamidade é um chamado de Deus para que os que permaneceram vivos venham a se arrepender. Essa declaração entra em choque direto com o chamado teísmo aberto, que estabelece uma suposta incapacidade de Deus de interferir nessas situações. Qual é exatamente a sua visão sobre essa corrente teológica?

JOHN PIPER – A menos que eu esteja desinformado, o teísmo aberto não teve muita repercussão nos Estados Unidos. Não vejo essa teologia ganhando terreno. As pessoas mais informadas biblicamente enxergam a negação da preciência de Deus como um conceito espiritualmente e intelectualmente repugnante. Elas sabem intuitivamente que Deus não é Senhor se não pode saber tudo o que virá a acontecer no futuro. O caso exegético que Greg Boyd, Clark Pinnock [principais expoentes dessa corrente teológica nos EUA] e outros tentaram estabelecer não convenceu os leitores mais cuidadosos da Bíblia.

 

E quanto às implicações pastorais do teísmo aberto?

Essas implicações não são percebidas pela maiora dos cristãos como algo reconfortante – a saber, o fato de que o mal que você vivencia pode ter surpreendido Deus da mesma forma que surpreendeu você. A maior parte dos crentes em Jesus entende que existe uma esperança bíblica muito maior de conseguirmos alcançar paz ao vivenciarmos o problema do mal por meio da sábia soberania de Deus – a posição reformada – ou da concessão do Senhor à autodeterminação humana (posição arminiana). Nenhuma dessas duas visões nega a preciência de Deus do jeito que o teísmo aberto faz.

 

Presenciei debates entre integrantes da chamada Igreja emergente, em que proponentes da versão brasileira do teísmo aberto – a chamada teologia relacional – foram bem ofensivos ao senhor. Cheguei a ouvir um pastor bastante influente entre jovens chamar o senhor publicamente de “fundamentalista enrustido de neocalvinista”. Como o senhor lida com esse tipo de reação?

Lido com esse tipo de crítica principalmente ao preparar e disponibilizar sermões, livros e artigos sólidos que são basedos o mais explicitamente na Bíblia que sou capaz de fazer. Rótulos desse tipo vão pegar ou não, em longo prazo, em função do que nós dizemos e fazemos e nunca pelo modo como respondemos aos nossos críticos. A pergunta é: ao longo de 30 anos de vida pastoral, de testemunho público e de uma produção literária sólida, a maioria dos cristãos espiritualmente saudáveis é auxiliada ou é ferida pelo que eu faço e digo? Conhecemos a árvore pelos frutos. Eu quero ser bíblico; então, ser “enrustido”, “fundamentalista” ou “calvinista” é bastante secundário. Desejo que, no todo, meu ministério seja definido pelas Escrituras. O Corpo de Cristo fará esse julgamento no curto prazo – e Jesus fará no fim.

 

O senhor já se manifestou criticamente em relação ao fato de o homem fazer planos – deixando claro que, em sua opinião, Deus não deseja que confiemos em nossos próprios meios. Como fechar a conta de maneira equilibrada, uma vez que a própria Escritura recomenda o planejamento das atividades humanas?

Respondo isso com a Bíblia. “Prepara-se o cavalo para o dia da batalha, mas o Senhor é que dá a vitória” (Provérbios 21.31). “Em seu coração o homem planeja o seu caminho, mas o Senhor determina os seus passos” (Provérbios 16.9). Deus nos deu vontade e raciocínio. Ele deseja que nós os usemos para discernir sua vontade e realizá-la, conforme Romanos 12.2. E Deus é absolutamente soberano sobre os mais ínfimos aspectos de nossas vidas. “A sorte é lançada no colo, mas a decisão vem do Senhor”, diz o autor de Provérbios. Assim, Deus deseja que nós decidamos na dependência de sua graça capacitadora, que planejemos na dependência de sua maravilhosa graça e que ajamos na dependência de sua maravilhosa graça.

 

Qual seria a razão para isso?

 A razão para isso é tamanha que, quando decidimos, planejamos e agimos, Deus recebe a glória por todas as coisas boas que advirão: “Se alguém serve, faça-o com a força que Deus provê, de forma que em todas as coisas Deus seja glorificado mediante Jesus Cristo, a quem sejam a glória e o poder para todo o sempre (I Pedro 4.11).

 

E de que modo saber que Deus é soberano em todas as nossas ações deve influenciar nossas ações cotidianas?

Essa certeza deveria tornar-nos humildes, ousados e prontos para arriscar tudo pela glória do Senhor.

 

Recentemente o senhor tirou um período sabático de oito meses. Qual foi o seu propósito ao se retirar da igreja por um periodo tão extenso?

Uma situação de estresse e a avaliação de questões espirituais em três áreas de minha vida me conduziram ao ponto de solicitar esse período de afastamento. Eu queria fazer uma análise em aspectos relacionados à minha alma, à minha família e ao meu ministério. E, quando me refiro a essa análise, estou me referindo a um esforço dedicado a discernir as motivações do meu coração, os padrões adotados em minha vida familiar e o ritmo de meu ministério. Às vezes, a melhor maneira de discernir a natureza de suas motivações é parar de fazer o que você está motivado a fazer. E, às vezes, os motivos de estresse podem ser de tal natureza que a melhor maneira de ver se eles são recompensadores – e podem ser – é removê-los. Fico feliz por ter me afastado esses meses.

 

E quais foram os resultados que esse período sabático lhe proporcionou?

Vou mencionar apenas um resultado: ao participar dos momentos de louvor em uma igreja irmã, confirmei para minha própria alma que amo Jesus em adoração e não apenas me realizo ao ajudar outras pessoas a amá-lo. Além disso, amei ouvir pregações bíblicas, mesmo quando não era eu o pregador. E também amei cantar junto com o povo de Deus, mesmo quando aquelas pessoas não faziam parte do rebanho que eu discipulo na igreja que pastoreio.

 

Muitos pastores hoje em dia dividem o púlpito das igrejas que lideram com uma série de outras atividades eclesiásticas, além de atuar como escritores e palestrantes – o que é o seu caso. Essa diversidade não prejudica o chamado intrínseco ao pastorado?

Um ministério mais amplo fora da igreja local pode impedir o pastoreio do rebanho. Afinal, se estou palestrando em uma conferência ou me dedicando a escrever um livro, não estou junto às minhas ovelhas nesses momentos. Logo, minha presença pessoal no pastoreio pessoal é menos frequente. É então que surge a pergunta: será que um pastoreio que segue esse modelo deve ser impedido? Não, desde que você tenha parceiros no ministério  – vocacionados ou não-vocacionados – que o auxiliam na condução desse trabalho.

 

Há possibilidade de a Igreja contemporânea resgatar a ortodoxia bíblica? Em sua opinião, quando o pêndulo vai se inclinar na direção da fé impoluta?

Todas as coisas são possíveis para Deus. Nenhum cronograma escatológico bíblico exige que as coisas se tornem piores no período da História do mundo em que estamos vivendo. Historicamente, Deus provocou reviravoltas espirituais, teológicas e sociais em alguns dos piores momentos da caminhada da humanidade. Não tenho nenhuma percepção clara nem discernimento da parte do Senhor para os nossos dias, tanto no que tange a um possível desdepertamento, a uma depuração ou a uma reforma de sua Igreja. Minha tarefa não é saber o que ele vai fazer, mas trabalhar e orar para o que ele pode fazer por meio da fidelidade de seus servos.

 

No Brasil, a teologia da prosperidade impregnou os setores da Igreja que estão com mais visibilidade na mídia, importada de ensinamentos de Kenneth Hagin e outros. Isso gerou uma enorme reação negativa da sociedade à Igreja e desvirtuou profundamente a mensagem do Evangelho. De que modo os setores mais ortodoxos da Igreja devem reagir a isso?

Parece-me que uma das testemunhas mais claras contra o “evangelho” herético da prosperidade é uma Igreja humilde, pronta a se sacrificar e a sofrer pela causa do verdadeiro Evangelho. E, com essa finalidade, nós precisamos de uma teologia bíblica robusta que fale de sofrimento e da soberania de Deus. Então, creio que os pastores deveriam abordar em suas pregações o tema do sofrimento.

 

De que modo?

Através de uma abordagem saudável da verdade de que Deus é mais glorificado em nós quando nos contentamos nele. E a grandeza de seu valor brilha mais reluzentemente quando esse contentamento é sustentado por meio do sofrimento e não da prosperidade. Isso redunda em que a glória de Cristo é nosso maior tesouro – e não riqueza, saúde, família ou mesmo a nossa própria vida. Logo, a pregação deve continuamente mostrar não que Jesus é o caminho para a properidade, mas que ele é melhor que prosperidade.

 

Outro movimento teológico que cresce no Brasil é o dos chamados "cristãos cansados da igreja": pessoas que foram feridas por pastores, membros, hierarquias, liturgias e instituições e que, por isso, defendem o exercício da fé cristã fora das estruturas eclasiásticas tradicionais. Como devemos responder a esse fenômeno, como indivíduos e como comunidade de fé?

 É impossível seguir o Senhor Jesus sem amar o seu povo. A apóstolo João disse que sabemos que já passamos da morte para a vida porque amamos nossos irmãos – e que quem não ama, permanece na morte (I João 3.14). O olho não pode dizer para a mão que não precisa dela. Assim, mesmo que uma pessoa abandone uma igreja institucional, o espírito de adoção vai conduzi-la a outros crentes em Jesus. E, mais cedo ou mais tarde, essa comunhão vai desenvolver algo como “estruturas eclesiásticas” institucionais. A Bíblia regulamenta a igreja por meio de presbíteros e diáconos, conforme I Timóteo 3. Algo parecido com isso vai surgir, a menos que a referida comunhão se retire da Palavra de Deus e do amor.

 

E qual é a atitude cristã correta em relação a esses que se afastaram?

Deveríamos nos arrepender em amor dos pecados que eventualmente tenham afastado essas pessoas e estabelecer reformas que removam todos os tropeços antibíblicos. E, então, deveríamos, com toda humildade, tentar trazê-los de volta.

 

O tráfego de informações e influências por meio da internet tem feito as paredes denominacionais, doutrinárias e teológicas cairem de modo inédito na história do cristianismo. Isso ocorre pela ação de blogs, redes sociais, sites de transmissão de vídeos e similares, essenciamente. O senhor consegue enxergar, em médio e longo prazos, que efeitos esse fenômeno trará para a Igreja, em especial no processo de formação de conceitos na mente de cada cristão?

Não, não consigo. É muito cedo para dizer que efeitos advirão disso tudo. É fácil se tornar um profeta do apocalipse e predizer os efeitos que a informação e o entretenimento desenfreados terão sobre nós. Certo é que atualmente andamos mais distraídos. Dedicamo-nos muito mais a buscar frivolidades na internet. Também estamos mais facilmente em contato com material que pode nos corromper, como pornografia ou imbecilidades que anestesiam a nossa alma. Porém, nada disso é irreversível. E as possibilidades de colocar à disposição materiais positivos para uma quantidade cada vez maior de pessoas devem superar os problemas. É por isso que devemos orar – e é nesse sentido que devemos trabalhar.

 


 

Seria o apóstolo Agenor Duque o Rei das Heresias?

                                                 duque

Noticias gospel No final de dezembro, a revista Época, fez uma extensa matéria assinada por Aline Ribeiro e Harumi Visconti, sobre o apóstolo Agenor Duque, líder da Igreja Plenitude do Trono de Deus.

De acordo com a publicação da revista (Leia na integra), Agenor Duque é um grande encenador do emocionalíssimo, e isso faz com que pessoas lotem seus cultos que prometem milagres e transformações. A revista ainda fez uma dura crítica aos conceitos usados por Duque e sua esposa para angariar recursos financeiros para o marketing da igreja.

No entanto, nas últimas semanas uma página no Facebook, “O Rei das Heresias“, através de seus administradores tem publicado diariamente em suas postagens, as supostas heresias realizadas por Agenor Duque, sua esposa Ingrid Darakdjian e eu filho Allan Duque.

Devido ao grande número de denúncias da página ‘O Rei das Heresias’, o apóstolo já teria se defendido várias vezes em seu programa de televisão, segundo alguns, o apóstolo estaria procurando quem são os administradores desta página.

E de uma forma bem divertida, vários apoiadores da causa da página, estão enviando vídeos para serem publicadas, dizendo que eles também são administradores. Mas afinal, quem são os verdadeiros administradores da página ‘O Rei das Heresias’ que tem tirado o sono dos ‘Duques’?

O Portal Padom, foi atrás e entrevistou por e-mail um dos administradores, isso mesmo, um, pois na verdade eles são vários. Entre os administradores existe um pastor evangélico, um teólogo, analistas de TI e outros.

Enviamos um e-mail, e com maior carinho, a equipe da página respondeu nossas perguntas, que você poderá ler abaixo. No entanto, também enviamos um e-mail para o apostolo Agenor Duque através dos endereços plenitudedotronodedeusoficial@gmail.com, assessoria@iaptd.com.br e através do chat no Facebook, para ouvirmos o que ele tem para falar sobre essas polêmicas, e até o fechamento desta matéria, não recebemos a resposta.

                                            noticias-gospel-agenor-duque-o-rei-das-heresias

         Entrevista com o administrador da página ‘O Rei das Heresias’

 

Padom (PD) – Como surgiu a ideia de criar uma página no Facebook contando as heresias das igrejas dos dias de hoje?
Rei das Heresias (RH) – Surgiu da necessidade de se propagar o Evangelho nas redes sociais. Leia-se Evangelho como sã doutrina e não com as distorções que alguns analfabetos bíblicos fazem e despejam nas redes sociais. O Evangelho consiste na consciência de que somos pecadores, e que Cristo nos reconcilia com Deus. A nossa luta é essa.

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PD –  Na verdade, quantos são os administradores da página? Vocês podem revelar isso? Qual igreja evangélica vocês são membros?
RH – Somos em vários, dentre nós há um pastor, teólogo, analistas de TI, há um corpo jurídico envolvido e o monitoramento da página é 24 horas. Todos nós fazemos parte de uma Igreja Cristã, mas não vinculo a denominação ao que fazemos pois isto não representa a idéia formada por nenhuma denominação. Aqui foi um grupo de amigos, cristãos, cansados de ver gente sofrendo na mão dos falsos profetas, que teve coragem o suficiente de unir forças e recursos para enfrentar os falsos profetas, uma vez que os falsos profetas, com o dinheiro que tem, tentam todos os meios ilícitos para nos atingir.

PD – Além do Agenor Duque e seus filhos, quais pregadores ou cantores vocês já denunciaram as heresias?
RH – Já sim, em outros projetos. O Rei Das Heresias iniciou tendo como objetivo um falso profeta de cada vez. Neste período estamos falando sobre as aberrações de Agenor Duque.

PD – Vocês, não acreditam que denunciar esses pastores, não estão trazendo escândalo ao evangelho?
RH – Não! É importante entender que quem causa escândalo é quem prega mentiras, escândalo é pronunciar falsas profecias, escândalo é usar ilicitamente o dinheiro arrecadado na Igreja. Acho e entendo como essencial que nos manifestemos, assim como está escrito em 1 Coríntios 11:19, para demonstrar que no meio cristão há pessoas lúcidas, que lêem e discernem a Bíblia e não se conformam com o circo gospel. Não se conformam e não se vendem.

PD – Você acredita, que com as denúncias, as pessoas ‘acordaram’ e esses pastores perderam uma grande parte de seu rebanho?
RH – Sim, nós temos diversos testemunhos de pessoas que abriram os olhos, apenas não divulgamos nomes porque sair de uma denominação, hoje em dia, é sinônimo de sofrer coações e ameaças. Então preservamos a identidade destas pessoas e encaminhamos para igrejas Bíblicas quando estas indicações são solicitadas. E isso acontece com pessoas de diversas partes do Brasil.

PD –  Ameaças, vocês já receberam dos denunciados? Processos também?
RH – Ameaças, todas as possíveis e imagináveis. Processos neste projeto ainda não porque andamos em concordância com a Constituição Federal e não estamos difamando ninguém. Estamos expondo fatos e questionando se há coerência. Se alguém se sentir ofendido, o direito lhe assiste isso, que procure os meios legais, cientes que não somos ignorantes jurídicos e que o ônus de provar a acusação da difamação é daquele que se sente ofendido. A constituição se manifesta claramente sobre isso e por isso, temos nosso jurídico, caso alguma eventualidade descabida nos atinja. Sabemos que estamos debaixo de ataque de hackers contratados para descobrir quem somos, bem como tráfico de influência. O problema disso é que se chegam até nós por estes meios, nós teremos material suficiente para provar o caminho ilícito, então é uma espada de dois gumes para os hereges. E cabe dizer que são cristãos, como podem pagar um hacker ou alguém que tenha informações privilegiadas para nos encontrar? é no mínimo incoerente. Mas o ego deles os fará fazer isso, e se fizerem, vão arcar com as consequências legais disso.

PD – Deixe um recado para todos os seguidores de sua página e para os hereges:
RH – O recado é: Não alimente os falsos profetas, e rejeite qualquer ensinamento contrário ao que diz a Palavra de Deus. Leia o Evangelho e não deixe de lado os valores que Cristo ensinou. Siga firme na caminhada cristã com este discernimento que nem todos que falam em Nome de Jesus são verdadeiramente Cristãos. Orem principalmente por discernimento. Para os hereges: não almejo a vossa destruição, mas espero profundamente que se arrependam enquanto é tempo. Deixo uma frase como algo que nos norteia, além da Palavra de Deus. Uma paráfrase do filme V de Vingança “POR DETRÁS DE UMA PÁGINA EXISTEM MAIS QUE PESSOAS, EXISTEM IDÉIAS, E IDÉIAS SÃO A PROVA DE BALA” Abraço!

Você acha correto páginas como O Rei das Heresias, entre outras que tem denunciado pastores e cantores evangélicos que tem distorcido o verdadeiro Evangelho? Afinal o apóstolo Agenor Duque, realmente pode ser chamado de ‘O Rei das Heresias ‘? – Deixe abaixo a sua opinião!

Recentemente publicamos um artigo sobre isso intitulado “É correto um cristão: julgar, expor o erro e citar nomes?“, onde fizemos uma análise sobre este polêmico assunto.

 

Fonte: http://padom.com.br/

 


 

Entrevista com o Pastor e Teólogo Esdras Linhares

 

Esdras Mendes Linhares é bacharel em Teologia, possui Licenciatura em Letras pela Universidade Estadual de Maringá/PR, Mestre em Literatura Portuguesa, pastor na igreja Presbiteriana Renovada do Brasil, Diretor e também Professor no Seminário Presbiteriano Renovado de Cianorte/PR, Vice-Presidente no Presbitério de Cianorte/PR da Igreja Presbiteriana Renovada do Brasil, filho de Osair e Pr. Altair Batista Linhares que fundou o órgão missionário Mispa – Missão Priscila e Áquila, casado com Líbia Aparecida Silva, e, pai de Filipe Silva Linhares.

 

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1 – Pastor Esdras, como começou o seu processo de desenvolvimento e crescimento espiritual, suas primeiras atuações dentro da Igreja e a certeza do seu chamado?

Nasci num lar evangélico, sou filho de uma família presbiteriana. Ao longo da minha infância em muitas oportunidades acompanhei meu pai, pastor evangélico, nos trabalhos evangelísticos e reuniões e vigílias de oração. Sempre estive envolvido nos trabalhos da igreja evangélica. Fui presidente da liga juvenil e aos doze anos fui recebido como membro, através da profissão de fé, na Igreja Presbiteriana Independente de Teófilo Otoni – MG. Quando estava com 13 anos, num culto de despertamento vocacional na igreja, senti o chamado para o ministério. A partir de então, envolvi-me mais ainda com os trabalhos da igreja, posteriormente, fui líder dos jovens da igreja e comecei a pregar nos cultos da igreja e ao ar livre e nas igrejas da região. Com 17 anos ingressei no Seminário Presbiteriano de Cianorte para fazer o curso teológico.

2 – O Pastor presenciou a fase onde ocorreu o movimento pentecostal, dando início a Igreja Presbiteriana Renovada do Brasil que vem de uma linha tradicional, Igreja Presbiteriana Independente, na década de 60/70. Quais foram os acontecimentos que marcaram esse momento?

Sim. Foi um momento maravilhoso para todos nós. Em 1972 fui batizado com o Espírito Santo no Encontro Nacional de Renovação espiritual em Recife. Eu era adolescente na época e me envolvi totalmente nesse movimento. Tínhamos frequentemente vigílias de oração, cultos maravilhosos, repassados da bênção e da unção do Senhor. Fazíamos cultos na praça da cidade todos os domingos, antes do culto na igreja e vínhamos louvando a Deus no trajeto da praça para a igreja. Nesse tempo, aprendi a tocar violão e tornei-me músico da igreja. Saíamos nas tardes de domingo para evangelizar e a igreja experimentou um crescimento exponencial nesse período.

3 – Há muitas igrejas neopentecostais hoje no Brasil e são igrejas que crescem muito, pois pregam a teologia da prosperidade e atrai muitos seguidores. Como o senhor vê essas igrejas?

Acredito que o evangelho de Cristo deve ser pregado na sua completude. O evangelho de Cristo é muito mais que a busca da prosperidade financeira. O grande problema de uma pregação parcial do evangelho é que se omitem outros aspectos essenciais como, a verdadeira espiritualidade, a busca por uma vida de piedade e consagração a Deus, o compromisso de tomar cada um a sua cruz e seguir a Cristo, dentre outros. As igrejas se tornaram um balcão de prestação de serviços, para onde as pessoas vão em busca de serem atendidas nas suas necessidades imediatas, mas não se preocupam com as verdades cristãs que verdadeiramente transformam-nas em novas criaturas. Esse é o fenômeno da secularização da igreja cristã, em que as pessoas apenas usam Deus para alcançar os seus objetivos.

4 – Historicamente percebemos no passado e presente diversos tipos de perseguições e sofrimentos, desde físicas a moral/psicológicas, de cristãos e aqueles que desenvolvem o seu chamado. Quais são os desafios mais atenuantes enfrentados pela Igreja, conforme seu ponto de vista, atualmente?

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Penso que o grande desafio da igreja hoje é ser uma igreja verdadeiramente cristã. A igreja não pode flexibilizar princípios bíblicos que são inegociáveis, mesmo que isso venha a resultar em perseguição e sofrimento. Há muitos cristãos sofrendo e morrendo por Cristo ao redor do mundo, vítimas de extremistas de outras religiões e até de governos. A igreja precisa estar verdadeiramente aderida a Cristo para se manter firme e enfrentar até mesmo as perseguições.

5 – O senhor é Diretor do Seminário Presbiteriano Renovado na cidade de Cianorte/Paraná, seminário esse que tem 50 anos e grandes homens de Deus passaram por aqui. Como é lidar com isso?

É uma responsabilidade muito grande. Muitos são os desafios. O que nos dá segurança é saber que fomos designados por Deus para desenvolver esse trabalho. Cada pessoa tem uma missão a cumprir para Deus. Os homens de Deus que passaram por esta Casa de Profetas desenvolveram um trabalho de excelência no seu tempo. Nos sentimos honrados porque Deus nos deu o privilégio de estar aqui desenvolvendo um trabalho para ele, num lugar tão significativo para todos nós, no tempo dEle. Cada um de nós tem o seu tempo e o seu trabalho a desenvolver. Tenho procurado entregar-me para fazer o melhor para Deus e realizar um trabalho produtivo para a igreja.

6 – O curso de teologia não só serve para pessoas que serão lideres religiosos, como também para aqueles que têm o interesse de aprofundar o conhecimento; contudo, para aqueles que serão lideres servem de base, assim como qualquer outro curso fornece base para sua atividade. Qual é a sua opinião acerca de líderes que são vocacionados, mas que não possuem formação teológica?

A vocação é marcante. É a base para a renúncia, para a entrega ao ministério. Acredito que cada pessoa vocacionada tem a sua importância para a obra de Deus. Há pessoas que se encontram em lugares e circunstâncias em que é impossível se deslocar para vir ao seminário. Acredito que há lugar para todos na obra de Deus, mas aqueles que não têm uma formação teológica, frequentemente, ficam muito limitados. Penso que se alguém é vocacionado por Deus deve buscar a formação teológica, mesmo que isso implique sacrifício para si mesmo e para a sua família.

7 – Quais os conselhos o senhor da para os seus formandos em teologia?

Tenho o privilégio de ministrar aulas para os formandos no seminário. O que eu tenho dito a eles é que confiem acima de tudo no Deus que os chamou. O conhecimento teológico é extremamente importante, mas é impossível desenvolver um trabalho frutífero na obra de Deus, tendo como base apenas o conhecimento. O ministério cristão é um trabalho essencialmente espiritual. O conhecimento teológico é de extrema importância, ao lado de uma vida de consagração a Deus, oração, dedicação, responsabilidade e trabalho.

8 – Quais os conselhos que o senhor da para os que têm interesse em cursar teologia?

Que busquem uma instituição idônea, que tenha uma teologia conservadora, cristocêntrica, bíblica e que ensine, não apenas princípios teológicos, mas que ajude a desenvolver outros aspectos do ministério que são também importantes. Acredito também que é importante buscar uma instituição que enfatize os aspectos práticos do pastoreio e do ministério e que estimule e promova uma busca por uma vida piedosa, de consagração a Deus, de oração e compreensão do verdadeiro sentido do que é ser ministro de Cristo ao lado de um ensino de excelência.

9 – Quais são as suas considerações finais?

Mais do que nunca, necessitamos buscar a presença de Deus. Haja vista que o mundo está cada vez mais corrompido pela maldade. Só uma vida de total consagração a Deus nos dará condições de suportar as adversidades. Ministério pastoral é entrega total a Deus. Muitos pastores tem se perdido na caminhada porque se esqueceram do principal objetivo das suas vidas que é servir a Deus. Precisamos voltar a Deus. Somente uma volta a Deus, a começar pelos ministros eclesiásticos, salvará a igreja e nosso mundo.

por: Daniel de Paula

Fonte: Portal Padom

 


 

Apologetics315 – Entrevista com Norman Geisler

Posted by Apologetics315 in APOLOGÉTICA

normangeisler

Tradução: Nathan Cazé

A seguinte transcrição é da entrevista com o Norman Geisler do Apologetics 315.

O texto original em inglês pode ser visto aqui.

Áudio original aqui. Se você gostar das transcrições, por favor considere apoiar, que faz isto possível.

BA: Olá, eu sou o Brian Auten da Apologética 315. A entrevista de hoje é com o apologista Norman Geisler. O Dr. Geisler é o autor, ou coautor, de aproximadamente setenta livros e centenas de artigos. Ele ensinou teologia, filosofia, e apologética em nível de faculdade ou graduação por cinquenta anos. Ele tem dito ou debatido em aproximadamente seis países, em seis continentes. Ele tem um BA, MA, ThB, e PhD em Filosofia, e ele tem ensinado em seminários nos Estados Unidos incluindo no Trinity Evangelical Seminary [Seminário Evangélico da Trindade] e Dallas Seminary [Seminário de Dallas]. Atualmente, ele é o Professor Distinguido de Apologética no Veritas Evangelical Seminary [Seminário Evangélico de Veritas] em Murrieta, Califórnia. O propósito desta entrevista é para saber mais sobre a experiência do Dr. Geisler como um defensor da fé. Obrigado por participar hoje desta entrevista, Dr. Geisler.

NG: É um prazer estar aqui com você.

BA: Bem, primeiramente, gostaria de reconhecer o impacto que você tem tido sobre tantos no âmbito da defesa da fé. E, os seus anos de fé nesta área, tenho certeza, tem influenciado muitas pessoas para entender mais a fé e aprender a defendê-la. Então, obrigado.

NG: Bem, por nada, é um prazer servir.

BA: Bem, Dr. Geisler, você tem ensinado na área de teologia, e filosofia, e apologética por mais de cinquenta anos. Então, o que lhe trouxe a este campo?

NG: Testemunhando, evangelismo. As pessoas que me levaram ao Senhor, me levaram para agir no dia seguinte. Evangelismo de porta em porta. Na próxima noite tinha reuniões [ou cultos] na rua. Quarta-feira tinha cultos de oração. Quinta-feira tinha culto na prisão. Sexta-feira era dia da missão de resgate. Sábado era Jovens para Cristo. Finalmente, domingo tinha igreja. Eu não sabia que alguém poderia desviar-se; eu simplesmente pensava que você tinha que servir o Senhor o tempo todo. O problema era que eu não sabia muito; era “treinamento no local de trabalho”. Mas, em primeiro lugar, não tive muito treinamento, tipo: zero. Algumas semanas depois de ser salvo já estava ocupado com as Testemunhas de Jeová e os Mórmons; e, um bêbado cambaleou em minha direção em um gueto em Detroit e disse: “Você não deveria estar fazendo isto”. Ele agarrou a Bíblia da minha mão e disse: “Sou um graduado da Moody Insta Bible Toot[1]”. E ele tomou a Bíblia de minhas mãos e disse: “Leia isto”, e apontou para a passagem bíblica no evangelho com letras vermelhas em que Jesus disse: “Vá e não diga a ninguém”. Ele disse: “Agora, saia daqui. Jesus não quer que você faça isto”. Eu não tive ideia alguma do que ele quis dizer, mas, devido a minha série de ocupações, tive que tomar uma decisão: ou eu terei que parar de testemunhar, ou terei que começar a dar respostas. E, escolhi a última, e comecei a dedicar a minha vida a isto.

BA: Bem, excelente. Foi do mesmo jeito que entrei na apologética; foi o evangelismo, deparando-me com questões difíceis e, então, encontrando um de seus livros. Portanto, obrigado por escrever os seus livros de apologética porque estes foram umas das primeiras influências. Atualmente, estou curioso para saber quais autores, ou apologistas, ou teólogos foram as maiores influências sobre o seu próprio pensamento e desenvolvimento.

NG: Bem, para começar, não tínhamos nenhum. Nem havia nenhum livro do C.S. Lewis naqueles dias. E, refiro-me a 1950, sessenta e um anos atrás. E, não tinha nada em que basear-me; eu tinha alguns professores na faculdade bíblica que tinham algum interesse em apologética e que foram influências na minha vida, como o Dr. Shaw que foi missionário por vinte anos e sabia falar árabe, e conhecia a arqueologia da terra. Isto foi muito influente. Eu tinha um professor que ensinava apologética e, posteriormente, tornou-se Capelão na Wheaton College [Faculdade de Wheaton], que foi uma influência na minha vida. E, em seguida, fui para o Faculdade de Wheaton. Tive o Dr. Kenneth Kantzer, um PhD de Harvard, e um grande acadêmico que influenciou a minha vida. E, sobretudo historicamente, fui influenciado por São Agostinho, e Anselmo e, particularmente, Tomás de Aquino. Chamo isto de “teísmo de triplo A”, A A A, quatrocentos A.D., aproximadamente mil A.D., e aproximadamente mil e duzentos [A.D.]. E a influência deles na minha vida, particularmente, a Suma de Teológica. Eu vi o brilho da mente apologética na prática, fui imediatamente atraído a este, e tenho sido um estudante desde então.

BA: Bem, enquanto falávamos sobre a mudança de cenário da apologética, por exemplo, quais livros estão disponíveis para nós?… ao longo das últimas décadas, como você tem visto este cenário transformar-se, como você disse que não havia livros do C.S. Lewis, ao ponto em que agora tem muitos recursos?

NG: Foi de zero em 1950, o ano em que fui salvo, ao que nós temos hoje que é surpreendente quando você pára para pensar sobre isto. Não havia livros apologéticos escritos por apologistas contemporâneos americanos até no final daquele ano. E foi publicado, acho que no ano seguinte, o livro de John Carnell sobre apologética cristã. Então, comecei com zero. A única coisa de C.S. Lewis que ouvia-se falar naquela época era as séries de Nárnia; e depois, é claro, os livro de C.S. Lewis foram uma grande influência; os livros de Francis Schaeffer, que eu conhecia pessoalmente e com quem trabalhei em algumas ocasiões, foram uma influência. Se não fosse por C.S. Lewis e Francis Schaeffer, praticamente ninguém naquela época, os anos 50, 60 e até mesmo os 70, teria estudado apologética.

BA: Bem, você mencionou Agostinho, Anselmo, e Aquino como sendo influências fortes e, é claro, clássicos. Quando você conversa com os seus alunos, há algum livro que você quase que faria a leitura mandatória para eles se eles fossem deste campo?

NG: Tudo que Lewis escreveu sobre o tópico é necessário. Ele é o maior apologista do século vinte. A influência dele ainda não foi impedida no século vinte. É claro, esses são somente para começar: Mere Cristianity [Mero Cristianismo], The Problem of Pain [O Problema da Dor], Miracles [Milagres], God in the Dock [Deus no banco dos réus], Christian Reflections [Reflexões Cristãs], The Great Divorce [O Grande Divórcio], e The Abolition of Man [A Abolição do Homem].

BA: Você tem visto algum tipo de tendências em mudança nas questões que os céticos ou descrentes perguntariam desde o começo da apologética e versus questões que você escutaria atualmente?

NG: Bem, geralmente, não; são as mesmas questões. Portanto, se você tiver respostas a elas, estas são questões desgastadas pelo tempo e a lista não tem mudado muito. A ênfase, a grande diferença hoje dos novos ateus e velhos ateus é que eles salientam mais o problema do mal, e eles salientam que o cristianismo é a fonte de todos os males na sociedade, e todas as guerras, e a desumanidade do homem ao homem. Então, além desta mudança de ênfase, é a mesma coisa, os mesmos argumentos contra Deus, o mesmo problema do mal que elimina Deus na mente deles, e que nós não temos qualquer evidência substancial de que Deus existiu ou que o cristianismo seja verdadeiro.

BA: Em seus estudos, e passando por todas estas questões difíceis e, digamos, assaltos contra o cristianismo, você já teve alguma dúvida ou já hesitou na sua fé e pensou: “Cara, eu não tenho certeza”?

NG: Nada sério. Pequenas dúvidas passam pela mente de pessoas, mas eu nunca tive qualquer problema com dúvidas. A dúvida é algo que eu tenho constantemente duvidado. E, se você duvidar das suas dúvidas, se você for agnóstico do agnosticismo, você não terá quaisquer problemas. Pessoas que tornam-se certas de suas dúvidas e seguras de seu agnosticismo têm problemas, o que auto-derrotante, é claro.

BA: Isto é uma das razões pela qual pergunto por que às vezes escuto quando pessoas começam a estudar argumentos de ateus, ou religiões diferentes ou algo, eles podem passar por crises da própria fé deles e começar a imaginar: “Cara, tipo, o argumento do outro lado parece ser bom”. Você teria algum tipo de conselho sobre como alguém deveria estudar, digamos, argumentos contrários?

NG: O meu professor de filosofia na faculdade bíblica na década de 1950 costumava dizer: “A próxima melhor coisa além de santidade é a lógica”. E a minha sugestão a eles é: estude lógica, aprenda como analisar argumentos, aprenda como analisar falácias. E, quando você aprender a fazer isto, você não temerá ateus e agnósticos porque há sempre alguma falha no argumento, e quanto melhor e mais astuto você for na lógica, mais rapidamente você conseguirá ver isto.

BA: Bom, bom. Bem, imagino se você tem visto algum crescimento positivo bem como na apologética acontecendo na igreja local; e como você recomendaria que as pessoas fizessem a apologética uma parte maior de seus ministérios locais?

NG: É encorajante ver o interesse na apologética hoje. Lembre-se, começar no zero e sem nenhum livro em 1950 ao que temos hoje – centenas, senão milhares de livros, e centenas de apologistas cristãos, muitos deles PhDs. E começamos a Sociedade Filosófica Evangélica [Evangelical Philosophy Society] lá na década de 1970, e isto está crescendo. Mais recentemente, começamos a Sociedade Internacional de Apologética Cristã [International Society of Christian Apologetics], e isto está começando a crescer. Temos várias organizações, vários acadêmicos, livros, recursos, faculdades, seminários que estão oferecendo graduações em apologética, e até mesmo o que normalmente chamamos de ministérios contra-seita ou discernimento; estes chamam-se de ministérios apologéticos. Eu dou seminários apologéticos, praticamente em 40 finais de semana por ano por todo o país. É realmente encorajante ver como as pessoas estão armando-se para a fé deles e tornando-se treinadas e fazendo o que a Bíblia nos ordena a fazer, que é dar a razão da esperança que está em nós, 1 Pedro 3:15.

BA: Bem, têm-se todos esses pequenos tipos de pequenos fogos começando a pegar por toda a nação e por todo o mundo. E, imagino o que você diria a alguém que não tem um fogo aceso em sua igreja caseira; este diria: “Eu realmente desejo que pudéssemos, entende, equipar melhor as nossas pessoas”. Quais seriam os primeiros passos que você os faria tomar para acender aquilo?

NG: Vá ao meu endereço eletrônico, normangeisler.com; lá tem todo tipo de recurso e há um artigo. Há artigos gratuitos; selecione o “An Apologetic for Apologetics” [Uma Apologética para Apologética. N.E veja a tradução deste material aqui]. E, então, veja por que é necessário e, então, volte ao seu pastor e seus líderes na igreja e encoraja-os a ensinar apologética na escola dominical. Faça uma série especial sobre apologética, ou convide palestrantes de fora; é isto que eu faço o tempo todo quando estou por todo o país, para vim e fazer uma série de apologética para agitar as pessoas. Moro perto do Centro de Billy Graham [Billy Graham Center], Charlotte, Carolina do Norte, e notei que o anuário dele dizia o verso preferido dele: “batalhar pela fé”, Judas 3. E precisamos fazer aquilo que Colossenses 4:6 diz: “A vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal, para que saibais como vos convém responder a cada um”. Então, eles só precisam tornarem-se cientes. Oseias disse: “Meu povo é destruído por falta de conhecimento”. Então, assim que ele obtiverem o conhecimento do que a Bíblia ordena, basicamente há quatros razões para praticar apologética – a Bíblia ordena isto, a razão demanda isto, a nossa cultura espera isto, e os resultados confirmam isto.

BA: Bem, excelente. Sei que muitos de nossos ouvintes são aquelas pessoas que estão interessadas em serem equipadas e envolvidas com a apologética de formas diferentes. Então, quero perguntar uma série de coisas diferentes que, talvez, os ajudará a tornarem melhores defensores. Então, falamos de livros diferentes que talvez os apologistas estariam lendo, talvez uma leitura obrigatória e coisas deste tipo. Mas, que tipo de tópicos você acha que são os mais valiosos que tais pessoas realmente precisariam focarem?

NG: Isto tudo resume-se em três questões hoje que estamos combatendo: pluralismo, relativismo, e naturalismo. O pluralismo diz que todas as religiões são verdadeiras. Isto é mortal ao cristianismo que afirma ser a verdade. Jesus disse: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”, João 14:6. Relativismo: a sua verdade é sua verdade, a minha verdade é minha verdade. Isto é mortal ao cristianismo porque este afirma ter a verdade absoluta: “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. E, o naturalismo: não há milagres e, é claro que, se não há ações por parte de Deus, não há Deus que possa agir. Então, a existência de Deus e milagres, tudo sob o naturalismo, a natureza absoluta da verdade, e a natureza exclusiva da verdade, seja o que for verdade, o oposto é falso para os nossos três inimigos.

BA: Ademais, no tocante às habilidades que você acha que os apologistas deveriam ter ou desenvolver, as habilidades orais me vem a vente, mas o que você recomendaria?

NG: Bem, primeiramente, você não somente precisa da inteligência básica que, também, todos os interessado têm, mas você precisa usá-la; estude para apresentar-se a Deus como aprovado. O falecido Dr. Barnhouse disse que: “Se eu tivesse trinta anos para viver, eu estudaria vinte e pregaria dez”. A maioria de nós estudaríamos três anos no máximo e pregaríamos vinte e sete. E você consegue ver quando você nos escuta. O meu pastor costumava dizer: “Uma lata vazia faz mais barulho do que uma cheia”. Precisamos estudar para apresentar-nos a Deus como aprovados. Comece em sua própria casa; estude o nosso curso de apologética. Visite o nosso endereço eletrônico, normangeisler.com e pegue o curso de apologética, o instituto leigo, e você poderá pegar um certificado fazendo os cursos. Se você quiser ir além, temos um curso de extensão do Seminário Evangélico Veritas [Veritas Evangelical Seminary], onde eu ensino na Califórnia onde você pode estudar tudo com DVDs, todas as aulas, você pode estudar diretamente da sua casa e ganhar um certificado em apologética. Mas, treine-se; não vá lá fora sem nenhum treinamento. Isto seria como enviar um soldado para a batalha sem treinamento, sem armas, sem uniforme; será fatal.

BA: Muitas pessoas envolvem-se sendo mal equipadas, como você havia dito…Que tipo de armadilhas você advertiria os cristãos defensores a terem cuidado?

NG: Bem, não pense que você converterá o mundo da noite para o dia. E não pense que você converterá todo mundo. A nossa obra não é trazer todo mundo a Cristo, é trazer Cristo a todo mundo. E a nossa obra não é converter todo mundo, somente o Espírito Santo converte-os. A nossa obra é guiar o cavalo à água, e somente o Espírito Santo consegue fazê-lo beber. Mas, temos que convencer o cavalo de que há água, e que a água é boa, e que devem beber dela; é daí que entra a evidência. Então, a nossa obra é apresentar a evidência, e você provavelmente terá três alternativas, assim como o Apóstolo Paulo teve três resultados – alguns creram, alguns zombaram, e alguns dizem: “Te escutarei novamente”. E, se você tiver este tipo de sucesso, considere-o bem sucedido.

BA: Estou pensando sobre a ideia de alguém estar bem preparada em seus estudos e a maneira em que alguém aborda a disciplina de apologética. Imagino se você diria que há áreas particulares que possam estar subdesenvolvidas e deveriam ser fortalecidas enquanto que você pesquisa o cenário.

NG: Claro que sim; a melhor coisa que você pode estudar é a filosofia, porque tudo resume-se na análise final a um problema filosófico ou uma objeção, não importando se isto decorre da ciência ou história porque é a filosofia da história na raiz disto.  Então, estude filosofia e seja bem treinado. Aprenda, você não consegue aprender tudo o que Deus não pode usar porque pessoas diferentes procedem de ângulos diferentes e, quanto mais você sabe, mais pessoas você pode alcançar. Mas, particularmente a filosofia e, então, é claro, a história, porque é ai que o mundo real está e era, e a história de tudo está lá, inclusive a Bíblia e literatura, porque é ai onde você aprende as grandes expressões da verdade. Então, torne-se completamente equipado, totalmente treinado, utilize a armadura de Deus e, então, encare o inimigo.

BA: Qual é o papel que você acredita que a teologia exerce nos estudos de alguém e, sobretudo, treinamento?

NG: Bem, a apologética significa defender a fé, e você não consegue defender a fé ao menos que você saiba o que é a fé; e a teologia é absolutamente necessária para conhecer o significado da fé. A teologia nos diz o que acreditar; a apologética nos diz porquê acreditamos naquela. Então, precisamos estudar a teologia. Por esta razão escrevemos o livro Conviction Without Compromise [Convicção Sem Compromisso]. Este tem as quatorze doutrinas fundamentais básicas. Você precisa saber quais são elas, o que a Bíblia ensina sobre elas, como defendê-las porque, mais cedo ou mais tarde, você será chamado para defender o que você acredita. Se você quiser converter alguém ao cristianismo, eles quererão saber em que estão se metendo. Eles não querem dar um passo antes de analisarem, e nenhuma pessoa racional faz isto. Então, você dever estar certo de que você está bem equipado na teologia porque eles têm algum tipo de teologia distorcida. Todos têm uma teologia; a questão é se esta é boa ou ruim, se esta é formal ou informal, eles têm uma. E, nós temos uma boa e uma formal, e sermos capazes de articulá-la.

BA: Agora a pouco, você estava mencionando as três áreas: relativismo, pluralismo, e naturalismo. E, estou ponderando se isto é o que você vê, coisas que vêm contra o cristianismo caindo nestas categorias, ou você vê, talvez no horizonte, qualquer outro tipo de coisas que possam ser inimigos potenciais do evangelho?

NG: Estas são categorias bastante abrangentes. Quase tudo o mais é uma divisão destas. Se você analisar todos os problemas na filosofia que os cristão têm que encarar, tudo resume-se em defender o relativismo e  significado, relativismo e verdade, relativismo e morais. Mas, o relativismo é um inimigo mortal e, é claro, você tem que defender o exclusivismo, de que o oposto de ‘verdadeiro’ é ‘falso’. Vivemos em um mundo onde pessoas pensam que você pode crer em perspectivas opostas que podem ser ambas verdadeiras, e os opostos não podem ser verdadeiros. Ou há leite na geladeira ou não há leite; não pode haver ambos leite e não leite no mesmo tempo e no mesmo sentido. Então, o pluralismo, relativismo, e naturalismo, bem, quase todas as ciências; o que é o criacionismo versus evolução? É o naturalismo versus o sobrenaturalismo. Eles desconsideraram o sobrenatural, e então nos dizem que a evolução deve ser um fato. Por quê? Porque eles já desconsideraram a única principal alternativa, nomeadamente, um ato sobrenatural. Então, estas são as três questões, e temos que ser treinados com relação a elas, e toda subdivisão importante delas.

BA: Uma coisa que você fez em vários de seus livros é fazer esboços de vários argumentos para a existência de Deus. Então, gostaria de saber qual evidência que você acredita que seja a mais forte de que Deus exista.

NG: Bem, o argumento mais forte que creio é o argumento cosmológico, e a forma mais forte desta creio que seja o que é chamado de a Forma Vertical do Argumento Cosmológico – de que algo existe, nada não consegue causar alguma, portanto, algo deve eternamente e necessariamente existir. Até mesmo o Jonathan Edwards, quando era um adolescente, tinha criado um argumento que segue esta forma. Já vi pessoas convertidas no mesmo momento, dentro de minutos, porque você não pode negar a sua própria existência. Se você disser: “Eu não existo”, você tem que existir para poder dizer isto. Então, a sua própria existência é inegável, mas algo existe e nada não pode causar algo; então, algo precisa ter sempre existido, eterno, e deve ter necessariamente existido, porque se isto não necessariamente existiu, então não haveria fundamento para qualquer outra coisa que existe. Descobri que isto é o argumento mais poderoso e convincente.

BA: Nos teus debates com céticos e ateístas ao longo dos anos, eu também pondero sobre de quais céticos ou descrentes você aprendeu muito.

NG: Bem, aprendi muito de todos os céticos. Digo aos meus estudantes que eu passo muito tempo estudando e ensinando o que não creio, nomeadamente, a história da filosofia; estou escrevendo um livro sobre isto agora, The History of Philosophy From a Christian Point of View [A História da Filosofia de um Ponto de Vista Cristão]. Você deve ter um conhecimento do que está acontecendo, isto é, o pão e manteiga, isto é, de pé sobre ombros de gigantes. Como disse alguém: “Você pode aprender mais sobre o erro de uma grande mente do que você pode de uma mente pequena”. Porque, o erro de uma grande mente é um erro significante, e você aprende muito de erros significantes. Ademais, eu encorajaria ler [livros de] ateístas porque quando vejo as falácias, os fundamentos fracos sobre o qual eles baseiam a crença deles, estas me encorajam em minha própria fé. Então, não leio Streams in the desert [Correntes de águas no deserto], ou Daily Bread [O Pão de Cada Dia] para devoção; leio [livros de] ateístas, pois eles estão encorajando Nietzsche, Freud, e Fromm, e Feuerbach, e Schopenhauer, e todos os grandes ateístas. Porque enquanto leio-os, fortaleço a minha própria fé, e vejo como responder as falácias nos escritos destes, e posso fazer o que a Bíblia me ordena: destruindo todos argumentos, e toda a altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo, 2 Coríntios 10:5.

BA: Bem, enquanto você está mencionando devoções e lendo a literatura ateísta, acho isto divertido. Mas, ao mesmo tempo, pondero, quando você está falando de devoções a alguém que está tendo, realmente, obviamente, todos os cristãos deveriam ter, uma vida devocional e uma caminhada com o Senhor que eles buscam para ser fervorosos. Pondero o que você diria para encorajar os apologistas cristãos a manterem esta caminhada com o Senhor de perto, e fervoroso, e falar a estes sobre a vida de oração deles.

NG: Guarde a Palavra, e a Palavra permaneça em você. Habite na Palavra e deixe a Palavra habitar em você. Todo dia, eu começo o dia com oração. Fico de joelhos e oro, e dou a minha vida a Deus naquele dia. E, então, vou para o meu escritório o mais rápido possível e leio a Bíblia, capítulo após capítulo após capítulo. E então, quando terminar isto, começo tudo de novo, e leio-a novamente. Eu recebo mais e mais como uma bola de neve rolando por um monte. Você tem que ter oração – fale com Deus. Você tem que ler a Bíblia; Deus fala com você; você tem que compartilhar a sua fé com os outros. Você tem que estudar os grandes apologistas e pensadores e missionários do mundo cristão para que você possa crescer. Há quatro formas de crescer, e é como um banquinho com quatro pernas; esta não será muito estável. Deus fala com você, você fala com Deus – isto é oração e leitura Bíblica. Você conversa com outros – isto é testemunhar e ensinar. Os outros falam com você – eles compartilham o testemunho deles e a verdade deles com você, e você cresce.

BA: Falamos sobre argumentos diferentes que podemos utilizar para buscar vencer as objeções, ou talvez buscar ganhar pessoas para estas crerem que o cristianismo é verdadeiro. Como que você encorajaria as pessoas a desenvolverem um caráter forte e uma vida de integridade que falaria a isto também?

NG: Bem, sim, e não somente ler a Palavra, mas praticá-la. Tiago disse: “Não olhe para si mesmo num espelho e vá embora e esqueça que tipo de homem você é. Sejais praticantes da palavra, e não somente ouvintes”. Então, uma coisa é lê-la, e outra coisa é aplicá-la em sua vida. Então, o que você ler pela manhã, use a oportunidade para aplicar durante o dia. E, se você fizer isto, você crescerá, pois Pedro diz: “Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo, por desejo e leite da palavra [ou leite racional]”. E posteriormente, Hebreus 5 diz: “a carne da palavra”.

BA: Uma das coisas que me perguntaram foi que descobriram que eu estaria te entrevistando, e disseram que queriam ouvir você falar sobre algumas das ilustrações que você utiliza. Qualquer um que tem escutado as suas falas, rapidamente observa que você usa várias ilustrações para explicar ideias. Então, você tem uma ou duas ilustrações preferidas ou as melhores que você normalmente usa?

NG: Uma que utilizei em debates por muitos anos com ateístas foi uma que peguei do livro de Richard Taylor sobre metafísica, e adaptei-a e modifiquei-a um pouco. Um ateísta e um teísta foram caminhar na floresta e eles viram uma bola de vidro com oito pés de diâmetro e ele disse: “De onde veio isto?”. E o ateísta disse: “Não sei, mas algo deve ter causado-a”. E o cristão disse: “Bem, e se fosse dezesseis pés de diâmetro, precisaria mesmo assim de uma causa?”. E o ateísta disse: “Sim, é claro, se pequena bolas precisam de causas, e outras maiores precisam de causas, então bolas muito, muito grandes precisam de causas também”. Em seguida o cristão disse ao ateísta “E se fizermos a bola do tamanho de todo o universo, esta ainda precisará de uma causa?”. O ateísta respondeu: “É claro que não! O universo simplesmente está lá”. Todo mundo entende o ponto. Aumentar o tamanho não diminui a necessidade de uma causa, isto aumenta-a.

BA: Ok, você tem outra?

NG: Bem, tenho muitas delas. Não estou dando cópias, mas aquela simplesmente acabou sendo sobre a existência de Deus. Então, há inúmeras ilustrações; vamos falar uma engraçada para a audiência. As pessoas riem de milagres. Céticos riem de milagres. E eu falei sobre a garota que estava acima da calçada com a Bíblia dela evangelizando, e o cético veio a ela e disse: “Você não acredita nisto, né?”. E ela disse: “Sim, eu creio nisto”. E ele disse: “Bem, isto não pode ser verdade. A ciência tem refutado partes da Bíblia”. E ela disse: “Como o quê?”. E ele disse: “Bem, como Jonas e a baleia. Você não consegue viver por três dias e três noites na barriga de um peixe grande. Os líquidos gástricos no estômago te comeria; Não haveria ar para respirar”. E ela disse: “Você está falando de Jonas, e eu creio que é verdade”. E o cético riu e disse: “Bem, como que você sabe se é verdade?”. E ela disse: “Bem, quando eu chegar ao céu, perguntarei a Jonas se é verdade”. E ele riu e disse: “Bem, e se Jonas não estiver no céu?”. E ela disse: “Então você pergunta”.

BA: Muito bem, muito bem. Falando novamente daquelas pessoas que escolheram estudar a área de apologética e que querem seguir adiante nisto, como que você recomendaria que elas prosseguissem mais profundamente nesta área? Algumas pessoas gostariam de buscar algum tipo de graduação; então, quais são as suas recomendações a pessoas que vêm a você depois de uma palestra e dizem: “Dr. Geisler, qual é o próximo passo?”.

NG: Bem, comece em um nível básico. Pegue o nosso livro I Don’t Have Enough Faith to be an Atheist [Não tenho fé Suficiente para ser ateu, já publicado em portugês] porque este abrange todos os detalhes deste tópico. E, leia-o, e seja desafiado e inspirado por ele. Muitos ateístas, agnósticos foram salvos lendo-o. Se você quiser ir um pouco além, então pegue a nossa série sobre apologética, pegue nossos DVDs, “The12 Points That Prove Christianity Is True” [Os 12 Pontos que Provam que o Cristianismo é Verdadeiro], e escute-os. E, se você quiser se aprofundar mais um pouco, então faça o curso, faça o curso leigo de apologética; você pode adquiri-los da internet no nosso endereço eletrônico normangeisler.com. E, estude isto, e receba o certificado. Agora, se você quiser realmente levar a sério e receber um diploma acadêmico, então você precisa ir ao Veritas Evangelical Seminary [Seminário Evangélico Veritas]: veritasseminary.com, e inscreva-se. Todos os nossos cursos estão em DVDs, e temos os melhores apologistas de cada área dos Estados Unidos. O homem principal [no tópico de] Religiões do Mundo, Win Corduan, o principal homem em Apologética Histórica, Gary Habermas. Temos as pessoas principais em arqueologia à exemplo do Professor Collins; temos pessoas de todas as áreas, em seitas, Ron Rhodes. E estude sob os melhores, porque tudo está gravado em sala de aula; é a melhor próxima coisa além de estar-se lá, porque você pode ouvir a palestra, ver os estudantes, e prestar atenção às perguntas e, em seguida, você pode enviar suas próprias perguntar por e-mail e receber uma resposta também. Mas, você não pode de forma alguma ir à batalha se você não estiver equipado. Um homem velho e um moço estavam no campo de colheita colhendo trigo com a sua foice. Havia uma pequena nuvem nos céus e, ao passa que o dia terminava, a nuvem tornou-se maior e maior, e o homem velho sentou-se e começou a amolar a sua foice. O moço falou ao homem velho: “O que você está fazendo? Está vendo aquela nuvem? Uma tempestade está vindo; não jogue for a o seu tempo sentando-se ai amolando a sua foice; vamos terminar o trabalho”. E, eu diria que a melhor coisa que você pode fazer por você mesmo é amolar a sua foice. Eduque-se, informe-se, treina-se. E, então, estarás equipado para ir ao campo de colheita.

BA: Bem, amei aquela citação. Eu sei, algumas pessoas estão imaginando: “Eu também estou muito velho para buscar um novo diploma?”. Quais são os seus pensamentos sobre as diferentes caminhadas da vida que as pessoas possam estar no momento, e como que isto possa ser ou não ser para elas?

NG: Moisés tinha oitentas anos antes de estar completamente treinado. Ele gastou quarenta anos produzindo coro de carneiro na Universidade do Egito, e depois ele passou quarenta anos aprendendo a cuidar de ovelhas. E depois, depois de oitenta anos, ele estava pronto para passar quarenta anos servindo a Deus. Mas, olhe o impacto que ele teve no mundo – escreveu os primeiros cinco livros do Velho Testamento, a fundação de tudo mais, recebeu os dez mandamentos de Deus, escritos pelo dedo de Deus. Muitas poucas pessoas na história do pensamento têm sido grandemente usadas por Deus e estes não eram educados, e praticamente ninguém que recusou a ser educado foi grandemente usado por Deus. Sim, você encontra um D.L. Moody aqui, e um Pedro ali, mas quem escreveu metade do Novo Testamento? O Apóstolo Paulo. Moisés foi treinado em todo o conhecimento dos egípcios. Precisamos de pessoas que são grandes apologistas. Agostinho, Anselmo, Aquino, C.S. Lewis, todas as pessoas altamente treinadas e educadas. Então, às vezes Deus usa pessoas que não têm treinamento formal, mas Ele não usa pessoas que recusam-se a aprender, e recusam-se a aproveitar oportunidades que estes têm.

BA: Eu tenho outra questão que as pessoas têm sobre a escolha de seminários ou as diferentes áreas que elas possam estudar. À parte da idade que estas possam ter naquele momento, mas teriam, quais são os prós e contras de um diploma acreditado ou não acreditado? E quais considerações você acha que as pessoas deveriam ter com relação a uma ou a outra?

NG: Só depende do que você vai fazer com o diploma. Se for para o seu próprio enriquecimento, não fará qualquer diferença. Estude sob os melhores. Estude sob os professores que escreveram os livros. O nosso corpo docente no Seminário Veritas têm escrito mais de duzentos livros, provavelmente quase trezentos livros. Encontre o lugar onde você poderá estudar sob pessoas que têm produzido a melhor literatura e os melhores livros no mercado, porque é destes que você deve querer adquirir diretamente.

BA: Bem, pondero se devo fazer uma pergunta mais pessoal novamente, e isto está ao longo das linhas de diferentes experiências que você tem tido no ministério cristão, ensino, e apologética. Quando você olha para o passado, quais você acha que são as batalhas ou lutas mais importantes que você experimentou na sua vida, seja pessoalmente ou em uma perspectiva apologética?

NG: Bem, de uma perspectiva apologética, e comentarei sobre isto, as grandes batalhas que lutei nos últimos quarenta anos ou mais, depois que recebi meu treinamento inicial, porque estive envolvido nisto por sessenta anos. Fui para a escola por vinte anos, do segundo grau, de 1950 a 1970, recebi dois diplomas de bacharel, o equivalente a dois diplomas de mestrado, na verdade, um, mas o equivalente a outro, e um PhD. E então comecei a realmente produzir e escrever, tenho escrito, até agora, setenta e cinco livros, cuja maioria está relacionada a tópicos apologéticos. E, lutei batalhas principais, e não me arrependo de nenhuma delas, porque todas estão em grandes fundamentos. A batalha sobre Deus – quem é Deus, e quais são Seus atributos, e escrevemos um livro com este título. A batalha para a criação – escrevi quatro ou cinco livros sobre a criação versus evolução. A batalha para a Bíblia – escrevi quatro ou cinco livros sobre a inerrância e inspiração da Bíblia. Estas são batalhas que valem a pena lutar. Criação, batalha sobre Deus, batalha para a Bíblia, e agora estamos engajados na batalha para a verdade. A verdade é fundamental para tudo. “A Sua palavra é a verdade”, disse Jesus. “Conhecerás a verdade. E a verdade vos libertará”. Então, escolha as suas batalhas; não gaste todo o seu tempo debatendo quantos anjos podem dançar na ponta de uma agulha, ou qual será o fim da tribulação que dela sairemos; utilize o seu tempo na coisas grandemente essenciais da fé cristã, porque na Bíblia, as coisas principais são as coisas simples, e as coisas simples são as coisas principais. Descubra o que elas são, aprenda como defendê-las, e passe a sua vida fazendo-a.

BA: Bem, acho que isto é um bom conselho. Qual seria a sua previsão sobre onde serão desenhadas as linhas de batalhas no futuro?

NG: Bem, não tenho poder de enxergar o futuro e, se eu tivesse, não faria nenhuma profecia porque estas eu temeria que alguém pudesse reinstituir a lei mosaica e ser apedrejada. Porque estas, tenho certeza, conteriam falsas profecias. Mas, há novas tendências; você ver coisas que estão progredindo, e os velhos problemas são perenes. Se você for treinado em apologética – e a apologética lida com o naturalismo e pluralismo e relativismo – você estaria bem equipado. Penso de mim mesmo como um bombeiro. Tenho um carro de bombeiro, tenho o equipamento, sei apagar fogo mas, espero ver onde estão os fogos; não vou pra cima e pra baixo molhando as casas. Espero ver onde o fogo está para depois ir a este. Mas, quando você tiver o carro de bombeiro, e quando você tiver o equipamento para apagar os fogos, então você estará pronto para ir.

BA: Bem, pondero também, que tipo de legado você gostaria de deixar para a próxima geração de apologistas cristãos?

NG: Não é o meu propósito na vida. Meu propósito na vida é servir a Deus com todo o meu coração, alma, mente, e força. Como Jonathan Edwards disse, e estou parafraseando: “Deus quer alcançar o coração, mas Ele não quer ultrapassar a mente no percurso ao coração”. Então, o meu propósito é somente ser fiel, servir, usar os talentos que tenho para lutar as batalhas que estão próximas, e ter a capacidade de dizer 2 Timóteo capítulo 4 quando eu morrer: “Combati o bom combate, acabei a carreira”.

BA: Bem, quero lhe perguntar sobre a Veritas, mas quero fazer uma perguntar final antes disto e, isto é, depois de ter praticado apologética por tantos anos, se você tivesse somente uma coisa que você quisesse passar aos apologistas futuros, uma coisa que você aprendeu que seria a única coisa que você colocaria nas mãos deles para prosseguirem, qual seria este conselho?

NG: Pegue tudo [material para estudar] que você consiga. Você tem que dedicar-se. Você tem que fazer um esforço sério para aprender o tudo que você conseguir, para ser o melhor que você possa ser, no campo que você escolher, para que você possa dar a melhor defesa à fé. Eu não era um gênio. Eu não sou um gênio. Eu era uma pessoa comum. De fato, quando Deus tomou a minha vida, eu estava debaixo da média porque eu não conseguia ler; eu estava no último ano do ensino médio, nunca havia lido um livro por completo e eles descobriram que eu não conseguia ler quando eu estava no penúltimo ano do segundo grau e colocaram-me na aula de reforço, e Deus olhou para baixo e disse: “Há, Há, Há, Há”. Você pode ver porquê Sara riu. Porque isto é engraçado. Mas, Deus tem muita graça, e um senso de humor e, vinte anos depois, Ele me preparou para a batalha.

BA: Muito bem. Bem, finalmente, fale sobre Veritas de novo e as oportunidades que estão disponíveis lá – o que é, onde fica, tem cursos à distância, quanto tempo leva; as pessoas querem seguir estes tipos de coisas. Fale sobre elas.

NG: Veritas Evangelical Seminary [Seminário Evangélico Veritas]. Somente acesse veritasseminary.com, (significa: verdade) e tudo está lá. Os cursos estão delineados para você, você pode ganhar um diploma de mestrado, temos os melhores professores, a mensalidade menos cara, tudo em DVDs que você pode estudar de sua própria casa, ou você pode cursar em sala de aula no sul da Califórnia – Murrieta, Califórnia. Mas, é o melhor seminário para estudar apologética no país no tempo presente porque não há outro seminário que tem um corpo docente melhor e o corpo docente é o seminário. Temos os principais especialistas em cada campo, e Win Corduan que é o principal em religiões do mundo, e Ron Rhodes que é o cara principal sobre seitas; e temos os caras principais em teologia como o Wayne House. Eu ensino apologética e Gary Habermas apologética histórica; temos os principais arqueólogos – dois deles no país são de nosso corpo docente. É a melhor escola no país para estudar apologética porque tem o melhor corpo docente que têm escrito a maior quantidade de livros e os melhores livros sobre estes assuntos. Então, grandemente te encorajamos a acessar veritasseminary.com, pegar o cadastro, preenchê-lo; estude em sua própria casa, venha a Califórnia, mas estude tudo que você puder, pegue tudo que você puder, e esteja no topo.

BA: Dr. Geisler, muito obrigado por participar comigo hoje, e muito obrigado por seu labor no reino.

NG: Por nada, Deus te abençoe.

 

 Fonte: http://www.napec.org

 


 

Entrevista com Armando Marcos - Projeto Spurgeon

  
Internautas Cristãos
entrevista com armando marcos projeto spurgeonEsta é mais uma entrevista dos Internautas Cristãos, a exemplo de outras que já realizamos anteriormente com Jorge Fernandes, autor do blog Kálamos, e Lucas Maria e Yago Martins, autores do blog Deus em Debate.

O entrevistado desta vez é o Armando Marcos, do Projeto Spurgeon. Confira a entrevista:



O que é o Projeto Spurgeon?

Projeto Spurgeon é um blog que nasceu em 2009 quando senti que deveria reservar um espaço a parte dos textos do Spurgeon que eu postava em Proclamando Cristo Crucificado. Eu percebi que a grande maioria das postagens nesse blog eram do Spurgeon. Também percebi que na web praticamente não existiam sites onde você pudesse achar material do Spurgeon, a não ser na seção que existia no Monergismo e na Editora Fiel, e alguma coisa no site do Josemar Bessa, de resto, só material espalhado, esparso, sem nenhum tipo de organização. Também há um PDF que é distribuido na net, mas que nada tem nele além de textos do Monergismo compilado. Isso também foi um incentivo para um projeto próprio.

Projeto Spurgeon resumidamente é o que nosso moto diz "Projeto Spurgeon - Poclamando a Cristo crucificado", pois através dos escritos do Spurgeon, que são muitos, nossa meta e intenção é proclamar a Jesus Cristo e Seu evangelho a todos que acessam nossos recursos, tanto no site como nas redes sociais e em outros blogs. Não é somente uma defesa do Calvinismo em si, mas uma aplicação dele, pela web, de forma consistente teologicamente e na prática, e de edificação da Igreja, pastores e estudantes, proporcionando base sólida para o estudo das Escrituras.

O Projeto Spurgeon não é idólatra ao colocar Spurgeon num pedestal?

Não, e eu tento tomar o máximo cuidado para que não descambe nisso. O fato do Projeto em si foi uma escolha de pregar o Evangelho por esse meio, que é muito amplo e vasto (existe muito material dele na web em outras línguas, e pouco na nossa), com muita facilidade. Hora e meia traduzimos obras de outros autores e pregadores, apoiamos muitos sites diversos de Spurgeon, e nosso foco com o projeto é a glória de Deus, por meio de Cristo, pela pregação do Evangelho e edificação da Igreja pelo bom conteúdo teológico e pelas exortações práticas.

Se Deus usou a pregação de Spurgeon nos seus dias, por que não pode usar hoje? Se Spurgeon acreditava que o poder da Palavra pregada era tanto, que o Espírito poderia atuar na salvação de muitos por meio da publicação de sermões, por que não traduzir algo dessa obra e deixar o Espírito usar hoje esse material antigo? Nós sabemos que hoje é muito difícil que as pessoas leiam algo grande na net, mas quem sabe amanhã? Quem sabe quando alguém irá imprimir algo e distribuir? O ponto não é Spurgeon, e sim Jesus, e Ele corretamente anunciado e proclamado.

Quem foi Charles Haddon Spurgeon?

Eu editei a página do Spurgeon na Wikipédia (antes ela era minúscula, sem quase nada de informação, hehe). A mesma pode ser acessada em: pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Spurgeon

Quem é Armando Marcos?

Meu nome é Armando Marcos Pinto, sou gestor de negócios imobiliários por formação, e trabalho como promotor. Moro em São Paulo com meus irmãos Otávio e Felipe e minha mãe Sônia. Converti-me em 2002.

Por que o interesse pelas obras de Spurgeon?

Meu interesse começou ainda em 2005 e 2006, quando entrei em contato com os sermões dele pela web. Porém, consistentemente, na forma do Projeto, começou em 2008 e 2009. Em 2008 ganhei, pela Felire, um kit de livros de Calvino e J.C.Ryle em espanhol, e começei a ler em espanhol mesmo. Então me toquei que não seria tão difícil assim traduzir do espanhol para o português (claro, isso levando em conta o uso de um bom dicionário online, rs).

A partir disso comecei a pesquisar na net por material evangélico, em especial reformado e em espanhol, e achei o site Spurgeon Audio. Comecei a ouvir um sermão atrás do outro. Foram uma benção para mim, eles e os vídeos de John Piper e Paul Washer, que me abriram os olhos para perceber o que era realmente o Evangelho e as distorções que alguns fizeram dele. O Senhor usou esses meios para me fazer entender várias doutrinas e tirar dúvidas complicadas, como a eleição, a predestinação, o monergismo, a relação fé-obras, etc.

A partir disso, e de ler mais em espanhol (os livros que ganhei e os sermões do Spurgeon) achei que poderia começar a traduzir alguns sermões, e ampliar o leque deles disponível em português. Reparei que muito do que era traduzido do Spurgeon na web eram sermões que sempre focavam o calvinismo e as doutrinas calvinistas, mas ouvindo os sermões do Spurgeon e de outros, achei que seria necessário ampliar.

Como você avalia a situação da igreja brasileira atual?

Bem, tratarei só de uns aspectos: muito disso pode ser discutido, a começar quais realmente são as igrejas. Eu sinceramente creio que, do jeito que a coisa tem ido, é capaz do Brasil se tornar um arremedo do que os EUA já foram, uma nação evangélica, sim, mas depois só de nome.

De um lado, a igreja brasileira precisa de um genuíno avivamento: eu creio sinceramente que no Brasil o Senhor tem usado a Internet para esse propósito, divulgando para muitos o Evangelho. Mas é necessário que isso seja visto como uma questão de Igreja e de pessoas comprometidas com o avanço do Reino. Isso precisa passar para vida prática da Igreja, da evangelização e do culto e comunhão com os irmãos.

Em segundo lugar, precisamos parar de tratar a Palavra de Deus e o culto a Deus como algo leviano e secundário. O estudo da Palavra é essencial, evita muito das heresias e erros da Igreja, e isso deve ser incentivado de forma ordeira. Devemos levar a sério o culto ao Senhor; não que eu seja a favor de um princípio regulatório, ou algo assim, mas muitos consideram a Igreja como apenas um clube, ou como uma agência lotérica, onde a pessoa saca o que precisa e pronto.

Em terceiro, creio que a Igreja brasileira tem que parar de ser individualista e orgulhosa; muito do que acontece de errado em algumas igrejas é fruto da vaidade de pregadores e líderes. Por outro lado, muitos só querem saber da ideia ou teoria de seu pastor e ministério. Isso tudo tem que ser provado pela Palavra. Também, a igreja como corpo precisa voltar à ideia de que somos um conjunto, não podemos ter uma comunhão artificial de 15 minutos num domingo, e no resto da semana cada um cuida de si e Deus de todos. Isso, a meu ver, é essencial para acabar com a cultura do individualismo existente em muitos lugares.

Qual a relevância das obras de Spurgeon para a igreja brasileira atual?

Creio ser muito relevante por algumas razões:

1º Mostra que o amor a Jesus e à Sua palavra, e o estudo e paixão por ela, deve ser essencial para todos os que estão se preparando para o ministério.

2º Entender que Jesus e a conversão deve ser prioridade de todo aquele que é crente. Como Spurgeon mesmo disse: "todo cristão ou é um missionário ou um impostor".

3º É importante para aclarar muita coisa mal dita e mal explicada. Spurgeon, a meu ver, é prático na aplicação do Evangelho, e não fica se preocupando com miudeza, mas antes, ele trata do essencial. Ele é sim um defensor ao máximo do Calvinismo, mas não fica preso nisso, ele aplica a verdade na prática e em obras (ele fez muita coisa em vida demonstrando o reino de Deus por suas ações).

4º Que a glória de Deus é prioridade, que o Senhor é Deus, que Cristo é maravilhoso, e que é digno de ser louvado e honrado com uma vida de boas obras e de devoção a Ele.

Qual a relevância de Spurgeon para a igreja brasileira atual?

1º Spurgeon deve ser visto como um exemplo de fé e amor simples a Cristo e Sua palavra.

2º Spurgeon deve ser visto como alguém que se entregou completamente ao Senhor, mas que não foi perfeito e errou em muitas coisas.

3º Spurgeon deve ser visto mais pelo que ele pregou do que pelo que ele fez em si. Muitos admiram a inteligência de Spurgeon e a sua obra, mas devemos focar a causa disso, Cristo, e este crucificado, e não Spurgeon em si.

4º Spurgeon deve ser exemplo de que Calvinismo não é sinônimo de intelectualismo. Ele foi privilegiado em muitas coisas, mas não de uma forma somente acadêmica, mas prática e para que TODOS entendessem e compreendessem o Evangelho.

5º Spurgeon deve ser visto como exemplo de firmeza doutrinária, e de alguém que teve coragem de defender a fé e o Evangelho contra tudo e todos, e contra toda tendência moderna de sua época que ainda faz muito mal hoje em dia (liberalismo e pragmatismo).

Além de Spurgeon, quais outros teólogos e pregadores você recomenda?

Recomendo muito que todo que está começando na fé, ou que está começando a entender algo do Calvinismo, leia primeiramente Calvino, especialmente as Institutas da Religião Cristã, de ponta a ponta. Eu li (do conjunto da Felire) e achei que Calvino trata de muitos assuntos ligados à fé cristã e à Igreja que são essenciais e que todo cristão deveria entender. Não sei se é a tradução, mas para mim a leitura de Calvino foi fácil e muito prazeiroza. Muito do que ele diz nas Institutas surpreende muito calvinista (creio que "Calvinismo", como conhecemos, veio mesmo de Dort).

Gosto muito dos livros e escritos de Martin LLoyde Jones e J.C.Ryle, são muito fáceis e práticos, mas com muita profundidade teológica e percepção espiritual. Recomendo-os com gosto.

Dos pregadores de hoje, gosto muito do Paul Washer, a meu ver ele é o George Whitefield de nossa geração. Ele prega a Palavra com paixão, e mostra essa paixão não como algo fingido, e explica e prega a Palavra de Deus com temor e tremor; sou muito abençoado por ele.

Também gosto e recomendo muito John Piper, John McArthur, Peter Master, Robert Murray McCheney, Arthur Pink e John Bunyan; com certeza, quem puder adquirir livros e sermões deles, não perderá dinheiro rsrs. Dos arminianos, gosto dos sermões do Ravenhill e do Wilkerson.

Para quem entende espanhol, recomendo os sermões do pastor Paco Orozco, em Sermones Biblicos. Eu ouço sempre, são uma benção, é um pastor reformado do México. Vale a pena a ouvida, hehe.

Deixe uma palavra final aos leitores

Ame ao Senhor acima de tudo, e a Cristo. Procure entender o Evangelho o máximo que puder, viva para ele, imite a Cristo. Se você está começando a ouvir e a ler sobre Calvinismo, não se preocupe em entender tudo sobre ele, nem fique apaixonado por discutir uma ou outra questão. Com calma, clame ao Senhor que lhe guie, e estude e leia a Bíblia de forma ordeira e sem desespero.

E também, não deixe de comungar com os irmãos, mesmo que eles não entendam tanto disso e daquilo como nós. Uma coisa que eu evito muito é me achar mais entendido que outro. Eu não sou, ninguem é, todos sabemos em parte. Só no final conheceremos como devemos.

 Fonte: Internautas cristãos


 

 

Fé e Ciência - Entrevista com Karl Heinz Kienitz

Aguardem para breve o vídeo do programa Academia em Debate onde entrevistei Dr. Karl Heinz, do Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Enquanto isto, ele gentilmente permitiu que a entrevista viesse de forma escrita aqui para o blog.

Dr. Karl Heinz é engenheiro de eletrônica, graduado e pós-graduado (mestrado) pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Obteve seu doutorado em engenharia elétrica pela Escola Politécnica Federal de Zurique, na Suíça. Atualmente é professor no ITA. Sua área de especialidade chama-se Sistemas e Controle, a parte da engenharia diretamente relacionada à automação. Ele é membro da Igreja Batista em São José dos Campos.

É autor do blog Fé e Ciência, onde trata da relação entre estas duas realidades.

Segue abaixo a entrevista.


Augustus - O senhor é professor numa das escolas de tecnologia mais respeitadas do país, onde certamente os métodos científicos são seguidos com rigor. Ao mesmo tempo, o senhor é um cristão, que professa acreditar nos relatos da Bíblia. Existe alguma coisa na ciência que o obrigaria a desacreditar na Bíblia?

Karl - É quase o contrário: há coisas na Bíblia que me ajudam a confiar no método científico como uma ferramenta útil. Entre outras coisas, a Bíblia nos revela que Deus é consistente em seu governo da criação, e não cheio de caprichos (por exemplo em Romanos 1.20,  “Pois os seus atributos invisíveis, o seu eterno poder e divindade, são claramente vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas criadas, de modo que eles são inescusáveis.”) Assim, de antemão espero descobrir padrões regulares no estudo da natureza, e é a isso que se propõe o método científico.

Augustus Por que algumas pessoas insistem que há uma incompatibilidade radical entre a fé cristã e a ciência moderna?

Karl - Porque tais pessoas não possuem conceitos consistentes de ciência e fé (por exemplo confundem fé, religião e teologia, ou confundem ciência com plausibilidade), ou possuem motivos ideológicos para dogmatizar uma incompatibilidade entre fé cristã e ciência, que de fato não existe.

Augustus - Poderia dar uma definição de ciência? E dizer por que ela não conflita com a fé cristã de que há um Deus que criou todas as coisas?

Karl - Ciência é o conhecimento ou um sistema de conhecimentos que abarca verdades gerais ou a operação de leis gerais identificadas e testadas através do método científico. O método científico é um conjunto de regras básicas que fazem uso da razão para juntar evidências observáveis, empíricas e mensuráveis.

Embora procedimentos variem de uma área da ciência para outra, é possível determinar certos elementos que diferenciam o método científico de outros métodos. Primeiramente o cientista propõe hipóteses para explicar certo fenômeno ou observação de interesse. Baseado em suas hipóteses, o cientista faz previsões e então desenvolve experimentos e verificações para testar suas previsões. Previsões não confirmadas levam à rejeição das hipóteses. Hipóteses não rejeitadas eventualmente podem ser consolidadas em teorias. Toda hipótese ou teoria deve necessariamente permitir a formulação de previsões e permanece constantemente sujeita a novos testes, podendo ser refutada à luz de nova informação experimental. Todo o processo precisa ser objetivo, para que o cientista seja imparcial na interpretação dos resultados.

Outra expectativa básica do método científico é que todo o procedimento precisa ser documentado, tanto os dados quanto os procedimentos, para que outros cientistas possam analisá-los e reproduzi-los. Cientistas são fabricantes de mapas do mundo físico. Nenhum mapa nos diz tudo o que poderia ser dito sobre um terreno particular, mas numa determinada escala pode representar a estrutura existente com boa fidelidade. No sentido de uma verosimilitude crescente, de aproximações cada vez melhores da verdade sobre a matéria, a ciência nos proporciona um domínio cada vez mais firme da realidade material.

Retorno aos motivos para um “não-conflito” entre fé cristã e ciência, citando um motivo apenas. Como dito anteriormente, a Bíblia nos revela que o Criador é consistente em seu governo da criação. Portanto de antemão espero descobrir padrões regulares no estudo da natureza, ao que se propõe o método científico.

Augustus - Existem provas científicas da existência de Deus?

Karl - Não. Mas existem evidências científicas que apontam para a existência de um Criador. Várias dessas evidências motivaram a Teoria do Design Inteligente. Adicionalmente, evidências históricas, argumentos filosóficos e teológicos mostram ser mais razoável admitir a existência de Deus do que negá-la.

Augustus - As estatísticas nos dizem que mais 90 por cento da população brasileira crê em Deus e que apenas um mínimo é ateu. Mas quando a pesquisa é feita no âmbito da academia, a situação muda – a maioria dos cientistas afirma ser ateu ou agnóstico. Por que isto?

Karl - Uma grande parte do atual ceticismo, ateísmo e agnosticismo na academia deve-se ao espaço que damos a intelectuais impulsivos, que – em muitas ocasiões – deveriam pesquisar mais e falar menos. Como acadêmicos, precisamos ser críticos e pragmáticos para não aceitar discursos ideológicos. Deixe-me citar um exemplo. Em 1888 Nietzsche anotou a frase “Quanto mais próximo se está da ciência, maior é o crime de ser cristão,” num texto com o título Das Gesetz wider das Christenthum. Toda sua conduta e seu ensino transpiravam tal noção. O sórdido da frase é que ela foi escrita poucos anos depois que os cristãos Joule, Maxwell e Pasteur deram suas monumentais contribuições à ciência.

Hoje, na academia, a muitos parece adequado optar pela adoção simultânea da ideologia anticristã de Nietzsche e da ciência dos cristãos Joule, Maxwell e Pasteur, a quem Nietzsche - pela generalidade da sua frase – classifica de “criminosos”. Essa opção é essencialmente cultural e, na minha opinião, merecedora de reconsideração crítica.

Augustus - Entre os fundadores da moderna ciência há muitos pesquisadores que eram cristãos convictos, criacionistas – por que este fato é omitido quando o trabalho deles é mencionado em sala de aula?

Permita-me propor uma pequena reformulação na parte inicial da pergunta: não foram “muitos” cristãos convictos entre os fundadores da ciência moderna; foram todos, com poucas possíveis exceções, das quais não lembro uma sequer...

A menção à fé de cristãos que atuaram como cientistas é omitida em sala de aula por um de dois motivos: (a) o professor não tem a mínima ideia de que aqueles cientistas foram cristãos; ou (b) o professor é da opinião de que a fé cristã daqueles cientistas não teve relação alguma com a ciência que praticavam, o que em muitos casos – talvez na maioria dos casos – está em total desacordo com o entendimento dos próprios cientistas. Nos casos de Kepler, Joule e Maxwell, para citar 3 nomes apenas, a motivação para fazer ciência estava intimamente ligada à sua fé cristã. Mas a fé cristã não tem impacto somente na motivação para se fazer ciência: o respeito à vida humana, à integridade física e emocional de pessoas envolvidas na pesquisa, preocupação com os animais e com o meio ambiente, etc. são preocupações normais p/ um cientista de fé cristã.

Um cientista bastante conhecido na Europa, que enfatizou a importância da fé cristã para que se pratique uma ciência que sirva à humanidade e não prejudique à natureza foi Max Thürkauf, químico que recebeu o prêmio Ruzicka de Química, em 1963.

Augustus - Muitos jovens cristãos acabam perdendo a fé e abandonando o cristianismo quando entram no ambiente do ensino superior. Quais seriam as causas, na sua opinião?

Karl - O jovem cristão muitas vezes não está preparado para ter sua fé questionada. Além disso, muitas vezes, sucumbe ao “efeito rebanhão” (fazer, dizer e acreditar o que todo mundo à sua volta acredita) e/ou à “síndrome da admiração dos semi-deuses” (aceitar sem reflexão crítica o que professores afirmam). Nas igrejas os jovens precisam ser ensinados a expor, perguntar, debater, questionar e defender suas opiniões.

Augustus - Atualmente há um movimento crescente dentro da academia liderado por pesquisadores cristãos e não cristãos que questionam a afirmação do darwinismo naturalista de que a vida em toda a sua complexidade é decorrente de mutações e adaptações genéticas que  aconteceram meramente por acaso e que o propósito que se percebe na natureza é somente aparente. É possível para um cientista cristão que crê no Deus da Bíblia concordar que o acaso está por detrás da realidade?

Karl - Não vejo possibilidade de explicar a diversidade da vida com o acaso. Mas isto não decorre da minha fé no Deus da Bíblia. Cálculos de probabilidades feitos por diversos cientistas de renome deixam claro que em algum ponto de um (alegado) processo evolucionário seria necessário algo como um “direcionamento útil,” o que tornaria o processo “não-darwiniano”. Como cristão eu tenho certeza de que Deus tudo criou. Essa certeza é “pela fé”, exatamente como explicado na carta aos Hebreus, na Bíblia. Como engenheiro estou preocupado em trabalhar com a natureza e cuidar dela. Vejo grandes limitações para a investigação e articulação de uma compreensão abrangente das origens daquilo de que nós (inclusive nossa capacidade explicativa) somos parte integrante. A teoria de sistemas não suporta expectativas de que esse tipo de empreitada dê certo. Essa é a principal razão para que eu não me dedique a conjecturas sobre origens.

Augustus - Que conselhos o senhor daria a um jovem cristão que entra no ensino superior e especialmente na área das ciências exatas?

Karl - Acho importante que o jovem cristão conheça e leia sua Bíblia, pratique sua fé, mantenha contato com outros estudantes cristãos, leia bons livros e conheça a história dos grandes cientistas, inclusive daqueles com fé no Deus da Bíblia. (A todos os estudantes cristãos recomendo a leitura do livro “A mente cristã num mundo sem Deus”, de James Emery White; essa recomendação vale para estudantes de todas as áreas.)

Augustus - A ciência hoje está em guerra com a religião?

Karl - Ciência natural não está em guerra com a fé cristã; a segunda favoreceu o surgimento da primeira. Como disse Max Planck, a prova mais imediata da compatibilidade entre fé cristã e ciência natural, mesmo sob análise detalhada e crítica, é o fato histórico de que justamente os maiores cientistas de todos os tempos, homens como Kepler, Newton, Leibniz, foram cristãos. Mas alguns cientistas e alguns teólogos estiveram em conflito em várias ocasiões ao longo da história por motivos que precisam ser estudados e entendidos, para que aprendamos as lições pertinentes.

Augustus - A ciência elimina ou corrobora a fé em Deus? 

Karl - Teólogos de Alexandria (séc. IV e V) enfatizaram: (a) a unidade racional do universo e sua criação do nada por Deus; (b) a inteligibilidade do universo para a mente humana; (c) a liberdade contingente do universo. Essa concepção alexandrina favoreceu tanto o entendimento e usufruto da obra de Cristo quanto o desenvolvimento e uso do método científico. Grosseteste e Roger Bacon, que eu considero os primeiros cientistas (no sentido de usarem o método experimental) tinham o mesmo entendimento dos alexandrinos. O teólogo T. F. Torrance argumenta que o mesmo valeu para outros cientistas, como por exemplo Maxwell. Nesse contexto, entendo que a ciência, como bom fruto da dedicação intelectual e prática desses cristãos, acaba corroborando sua fé.

Augustus - Como é possível eliminar a tensão entre relatos científicos e religiosos sobre a origem do universo e da vida?

Karl - Entendo que há tensão entre interpretações teológicas específicas das Escrituras e interpretações e extrapolações de observações por cientistas. Teólogos e cientistas devem continuar trabalhando com dedicação, buscando sempre um entendimento compatível com a realidade.

Augustus - Para fazer ciência é necessário supor que o universo e a natureza são inteligíveis para a mente humana. Quais são as pressuposições metafísicas e epistemológicas que justificam a atividade científica?

Karl - Abaixo listo exemplos de crenças filosóficas que encorajam a pesquisa científica:

  1. Eventos no mundo natural tipicamente tem causas (imediatas) no mundo natural.
  2. O tempo é “linear”. 
  3. Causas e efeitos no mundo natural têm alguma regularidade no espaço e tempo.
  4. Causas e efeitos podem ser – ao menos em parte – racionalmente compreendidas.
  5. Os constituinte e comportamentos naturais fundamentais não podem ser deduzidos pela lógica a partir de princípios fundamentais. Precisamos utilizar observações e experimentos para aumentar nossa lógica e intuição.
  6. Estudar a natureza da forma indicada no item anterior é um investimento válido de tempo e talento.

Augustus - O universo e a vida são auto-existentes, auto-suficientes, auto-organizados, ou estão fundados numa realidade que transcende o nexo espaço-tempo-matéria-energia?

Karl - A história mostra que a quebra (pelos teólogos alexandrinos) da noção Aristotélica da eternidade do mundo foi seminal para o surgimento do método científico. Hoje a Física relata evidências que apontam para um início para o universo. Decido-me pelo entendimento cristão de que tudo que existe está fundado numa realidade que transcende o nexo espaço-tempo-matéria-energia; vejo dificuldades para quem prefere a outra opção.

Augustus - Há limites sobre o que a ciência pode nos dizer para explicar a origem e a realidade do universo e da vida? 

Karl - Há limites. Eu já indiquei minha “desconfiança” sobre o uso do método científico para encontrar uma explicação abrangente acerca da origem do homem. Louis Neel, Nobel de Física de 1970, disse que a busca do cientista por uma explicação abrangente da sua origem equivaleria à reconstrução da história do automóvel por um dos pistões de um motor automotivo.

Augustus - Sendo as teorias e os modelos científicos meros construtos humanos, com limites heurísticos, passíveis de revisão e até o descarte ao serem submetidas ao contexto de justificação teórica, as afirmações dos cientistas sobre a origem e evolução do universo e da vida não deveriam ser menos assertivas? 

Karl - Sim, definitivamente. Veja só esta declaração do Prof. Franz M. Wuketits (professor das Univ. Viena e Graz): “Nós pressupomos a correção de princípio da teoria da evolução biológica, pressupomos que a teoria da evolução possui validade universal.” Pressuposições desse tipo são incompatíveis com ciência.

Augustus - Hoje a ciência está fundada no materialismo reducionista. Os seres vivos, especialmente os humanos, e o resto da natureza, são o resultado apenas de matéria e energia?

Karl - A assertiva antes da pergunta não é verdadeira. A ciência está fundada no método científico e não no materialismo reducionista. Que o ser humano é resultado apenas de matéria e energia pode ser opinião de muitos, mas é uma opinião que esbarra em toda a ordem de problemas na discussão de ética, estética, emoções, consciência, etc.

Augustus - Esse materialismo reducionista ajuda ou atrapalha o avanço da boa ciência?

Karl - O materialismo reducionista atrapalha a boa ciência, entre outras coisas, pelos problemas éticos que provoca. O Prof. Max Thürkauf, a quem já mencionei, deixou claro que o materialismo precisa ser responsabilizado por muitas catástrofes nucleares e ecológicas que presenciamos no século XX. Thürkauf disse que, se quisermos uma ciência que sirva ao homem, o cientista precisa “orar e trabalhar”.

Augustus - Ideias, até as ideias científicas, têm consequências. Como conciliar a visão religiosa do ser humano ter lugar diferenciado na natureza e a visão darwinista que o reduz ao nível dos demais animais?

Karl - Não vejo possibilidade de conciliação.

Augustus - Se Deus não existe, tudo é possível (Dostoievski). Se a ciência na sua limitação heurística não pode falar sobre valores, por que os cientistas rejeitam a moralidade derivada das Sagradas Escrituras, e desvalorizam o ser humano – imago Dei supostamente baseados na ciência? 

Karl - A rejeição mencionada na pergunta ocorre por conveniência. O fenômeno já era explicado por Pascal: “A vontade, que prefere um aspecto a outro, afasta a mente de considerar as qualidades daquilo que não gosta de ver.” “O coração tem razões que a própria razão desconhece.”

Augustus - Os atuais avanços em diversas áreas científicas estão fortalecendo cada vez mais os relatos de criação das religiões monoteístas, mas a comunidade científica não aborda essas questões. Seria temor da falência do materialismo científico e que Deus retorne às universidades como uma ideia filosófica e cientificamente plausível?

Karl - Sim, acho que este temor existe em parte da academia. Porém fé monoteísta não resulta da interpretações científicas. Não é este o caminho a seguir. Em particular, a fé cristã tem uma natureza “a priorística” na medida em que pressupõe uma noção de Deus. Nesse contexto, algo como uma teologia natural pode ajudar um pouco. Acho que Romanos 1.20 legitima tal percepção.

Pessoalmente também considero interessantes argumentos filosóficos acerca da existência de Deus. Mas, o que é realmente importante (e independente de se crer em Deus ou não), é nos ocuparmos com a pessoa de Jesus, cuja obra e ministério estão descritos de forma confiável no Novo Testamento. Seus relatos nos obrigam a uma tomada de posição ou à ignorância deliberada, que seria incompatível com qualquer pretensão de seriedade. É ocupação com história... Além disso, fé cristã resulta em realidade observável na própria vida. A partir dela, se estabelece uma dinâmica do conhecimento de Deus, semelhante à dinâmica do conhecimento científico.

Acho muito útil a explicação de T.F. Torrance sobre a estratificação do conhecimento de Deus, para entender um pouco melhor a semelhança que existe entre conhecimento científico e conhecimento teológico cristão.
Fonte: http://tempora-mores.blogspot.com.br

 
                                O amigo dos mendigos

 

Entrevista com Wildo Gomes, líder da Missão Vida.

Com uma rede de mantenedores que, em sua maioria, contribuem com apenas 15 reais mensais, a Missão Vida atende cerca de 600 pessoas tiradas da situação de mendicância em diversas unidades, desde Goíás – onde surgiu e mantém o maior núcleo, na cidade de Cocalzinho – até Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia, Paraná, Amazonas e Distrito Federal. Mais que isso: a instituição ofererece formação profissional, treinamento em diversas áreas e, naturalmente, o caminho da salvação em Cristo. Por trás do ministério, a figura de seu fundador e presidente, o pastor presbiteriano Wildo Gomes dos Anjos, de 52 anos, se sobressai. Não é para menos: foi através dele que tudo surgiu, no comecinho dos anos 1980, quando o então rapazola ficou amigo de um mendigo. Todos os dias, Wildo levava comida e algumas roupas para o seu João.

Das conversas com o homem da rua, ele travou conhecimento com uma realidade bem diversa da sua, acostumado que estava com os confortos da classe média. Um belo dia, João morreu, na calçada. Da tristeza, Wildo resolveu que ajudaria outros “joões” que encontrasse. Da distribuição de cobertores e sopas, passou ao acolhimento numa casa, depois em outra e mais outra. Surgiram as unidades de reabilitação, os centros médicos, as oficinas profissionalizantes. O ministério cresceu; hoje, é referência na sua área de atuação em todo o Brasil e até no exterior. Ao longo desses mais de trinta anos, centenas de homens têm passado pelas unidades da Missão Vida. “Tudo é pela graça de Deus”, resume Wildo. Só assim ele explica o fato de trabalhar com gente tão afetada pela dureza da vida, pelo álcool e pelas drogas e, mesmo assim, jamais ter registrado qualquer conflito ou rebelião. Na Missão Vida, fica quem quer. E quem fica – a absoluta maioria – encontra um novo caminho na vida, uma nova família, um Deus e uma esperança, como o pastor conta nesta entrevista:

CRISTIANISMO HOJE – Quando surgiu a ideia de fundar a instituição?

WILDO GOMES DOS ANJOS –As coisas foram acontecendo de forma natural. Há um versículo que tem influenciado muito a minha vida, que diz: “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Filipenses 2.13). Primeiro, distribuí alimentos e cobertores; depois ajudei um mendigo, retirando-o da rua; em seguida, outro, e outro... Até que quase todo o meu salário era gasto com as despesas desses homens. Tempos depois, construí, com a ajuda financeira de alguns amigos e a mão-de-obra dos ex-mendigos, o primeiro centro de recuperação. Desde então, a Missão Vida vem crescendo e estendendo a mão para centenas de moradores de rua e pessoas carentes.

Quais foram as principais dificuldades, no início?

A primeira grande dificuldade foi eu mesmo crer que era possível a transformação de um mendigo. A segunda veio dos amigos e muitos dos meus familiares, que achavam que eu estava ficando meio louco. Havia um grande descrédito nas minhas ações. A igreja da qual eu era membro chegou a pedir que eu não levasse mais aqueles homens para a Escola Bíblica Dominical. Eu sempre me reunia com os ex-mendigos, antes de irmos para a igreja, em algum posto de combustível, levando comigo aparelho de barbear, roupas e desodorantes, para que eles aparecessem na igreja de forma mais apresentável. Mesmo assim, eles não eram aceitos.

Ao longo destes 32 anos, quantas pessoas, aproximadamente, passaram pelas diferentes unidades da Missão Vida?

O primeiro centro da Missão Vida tinha doze vagas. Hoje,  oferecemos 600 leitos em todo o país, sendo que praticamente todas as unidades trabalham em sua capacidade máxima. Não temos como fazer a estimativa de quantos homens já passaram pela instituição, mas seriam milhares, se considerarmos a rotatividade e os anos de trabalho ininterrupto. Para se ter uma ideia, nos últimos quatro anos, servimos 3 milhões de refeições, realizamos 47 mil procedimentos médicos, distribuímos 195 mil medicamentos. No Instituto Bíblico Palavra e Vida, já formamos 112 ex-mendigos em cursos de liderança.

E quanto ao índice de efetiva recuperação, há alguma estatística?

Temos observado que a grande maioria dos ex-mendigos permanece conosco durante, no mínimo, os três meses do programa de recuperação. Sete de cada dez ex-internos permanecem longe dos vícios e da mendicância após concluírem o programa. Outro ponto a ser destacado é que o apoio familiar ou de alguma igreja é fundamental para que eles não tenham recaídas – e, caso isso ocorra, consigam se colocar novamente de pé. Vale ressaltar, ainda, que acreditamos que, seja qual for o tempo que permanecem conosco, uma semente é plantada no coração desses homens. Uma semente que, ao tempo de Deus, florescerá.

Por que a entidade só aceita pessoas em situação de mendicância?

Quando iniciei o trabalho com a população de rua, procurei instituições que recebessem mendigos e não obtive nenhuma resposta afirmativa, mesmo nos casos em que havia dependência química. Esse era um público ainda não abrangido pelas políticas sociais públicas ou instituições filantrópicas. A Missão Vida surgiu para preencher essa lacuna e, com a prática, desenvolvemos uma metodologia própria de trabalho. Por isso, temos compartilhado nossa experiência com outras instituições e pessoas que queiram realizar trabalho semelhante por meio de um evento anual chamado Congresso Ação e Adoração. Apesar de 99% das pessoas que atendemos apresentarem algum tipo de dependência química, seu processo de recuperação agrega uma qualificadora importante, e que também é um vício: a mendicância. O indivíduo que permanece na rua por muito tempo, sobrevivendo de esmolas ou pequenos furtos, cria o hábito de não ter que trabalhar para suprir suas necessidades primárias, além da dificuldade de submeter-se a regras e horários. Essa questão é exaustivamente trabalhada nas unidades de recuperação da Missão Vida. Além de deixar para trás os entorpecentes, o interno também precisa se adaptar a uma rotina rígida de atividades que incluem devocionais, trabalho e lazer.

O mero assistencialismo, como a distribuição de sopão pelas madrugadas, por exemplo, acaba sendo o máximo que muitas igrejas conseguem realizar, mas não tiram a pessoa ajudada de sua situação precária. Isso ajuda ou prejudica?

Assistir significa ajudar, favorecer, proteger, socorrer. Acredito, sinceramente, que estender a mão ao necessitado é algo que devemos incorporar ao nosso cotidiano. A Bíblia diz que quem age assim é bem-aventurado. Essa versão negativa da assistência social como forma de manutenção do indivíduo em sua situação de necessidade deve ser analisada com muito cuidado, pois sua disseminação tem gerado uma visão distorcida das instituições que se propõem a fazê-lo. Posso garantir que a Missão Vida assiste a população de rua, tanto com a distribuição de sopa nas madrugadas como com a internação dos homens dispostos a sair da mendicância – porém, mantemos a preocupação de que o ex-mendigo mude sua situação e volte à sociedade como um cidadão produtivo. Aquele antigo provérbio chinês sobre dar o peixe ou ensinar a pescar tem sido usado pelos que combatem as atividades assistenciais, mas pergunto: é possível aprender a pescar quando se está faminto? 

Uma das críticas que se faz ao papel da Igreja Evangélica brasileira é quanto à falta de envolvimento com esse tipo de trabalho. O senhor concorda que existe essa inação social dos evangélicos?

Fico triste em dizer isso, mas a verdade é que a Igreja brasileira tem se distanciado de projetos que tenham como objetivo amparar, assistir e evangelizar. Qual a função social da Igreja? Além de congregar, orientar e amparar seus membros, cada congregação deve partilhar da tarefa comum de todos os cristãos: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura”, diz o texto de Marcos 16.15. Ao longo dos anos, muitas igrejas afastaram-se desse propósito. Infelizmente, não são poucas as que menosprezam o trabalho missionário e evitam tudo que possa, digamos, “desviar” a congregação de um objetivo individual e, muitas vezes, longe do propósito cristão e evangelístico. Falo isso com a propriedade de quem, há mais de três décadas, preside uma instituição filantrópica que se mantém de pequenas doações mensais de cristãos de todo o Brasil.

E é difícil captar essas doações?

Olha, temos enfrentado muitas dificuldades nos últimos dois anos e acredito que isso se deve à visão egoísta e egocêntrica de muitos líderes. Para se ter uma ideia, acabo de chegar de uma viagem a Minas Gerais, onde fiz a apresentação do trabalho em duas ocasiões. Somente duas pessoas preencheram ficha de compromisso, comprometendo-se a doar 15 reais mensais…

Nas unidades da missão, convivem centenas de homens das mais variadas origens e diferentes tipos de comportamento. Conflitos ou rebeliões podem acontecer a qualquer momento. O que se faz para prevenir ou contornar essa possibilidade?

Com a graça de Deus, nunca houve um único caso de violência dentro dos núcleos da Missão Vida. Os ambientes são frequentados por famílias e até crianças, sem jamais termos tido qualquer problema desta natureza. Acredito que a razão pela qual isso nunca tenha ocorrido deve-se ao fato de que, quando as pessoas são amadas e respeitadas, elas tendem a agir da mesma maneira.

Está em tramitação no Congresso o polêmico projeto que prevê a redução da maioridade penal, de grande apelo popular, sobretudo diante do aumento da violência. Qual a sua opinião sobre isso?

Sou totalmente a favor da redução. Em países da Europa e mesmo em vários estados americanos, crianças a partir de cinco anos de idade são responsabilizadas pelos seus crimes. O que está faltando no Brasil é penalizar e educar aqueles que vêm cometendo crimes bárbaros de todas as formas possíveis e imagináveis, certos de que não serão punidos.

Há algum tempo, o senhor chegou a ser acusado de explorar a fé pública para angariar dinheiro. O senhor vive de quê? Recebe salário da missão?

Quanto à questão financeira, eu me tornei uma pessoa próspera, mas sem jamais usar absolutamente nada do que era levantado para a Missão Vida em benefício próprio. Meu pai adotivo era oficial do Exército e agente da Receita Federal. Meu pai biológico, que vive ainda, é desembargador. Minha mulher, Rosane, tem condição financeira privilegiada. Além disso, comecei a trabalhar com 13 anos, nunca bebi ou vivi dissolutamente. Sei usar bem os recursos que possuo, e adoto os mesmos princípios na Missão Vida, que, mesmo tendo recursos tão limitados, vem cumprindo seu ministério de forma cabal, sem dívidas ou compromissos que não consigamos saldar. Tenho minha consciência e mãos limpas. Por isso, não me abato com as falsas acusações.

O chamado missionário parece perder força diante da pregação onde a maior bênção a ser obtida é o bom emprego, o bem material, o regalo pessoal. Em seu entendimento, de que maneira esse tipo de mensagem tem prejudicado o Evangelho no Brasil?

São muitos os aspectos prejudiciais dessa forma de levar homens e mulheres a Deus. Vou citar apenas dois: ela cria uma fé frágil e não prepara o indivíduo para enfrentar as dificuldades da vida cristã. Se a fé de alguém se baseia na eventual resposta de Deus a seus anseios pessoais, essa pessoa vai questionar a providência divina, caso não seja atendido. Além disso, Deus não nos prometeu uma vida sem sofrimento. Muito pelo contrário: Tiago fala que é motivo de alegria passar por “diversas provações”, pois a prova da nossa fé produz perseverança. Uma fé firmada na prosperidade não resiste às provações. A fé precisa ser consolidada nos princípios bíblicos de amor a Deus e amor ao próximo, e só assim teremos cristãos verdadeiros e espiritualmente saudáveis. E, se ampliarmos o universo do impacto da teologia da prosperidade além da vida do indivíduo, vamos ver o egoísmo tomando o lugar do altruísmo e da solidariedade e o amor ao próximo dissipado numa torrente de amor a si mesmo.

 

Fonte: http://www.cristianismohoje.com.br


 

 

 



 

 

Entrevista exclusiva com Caio Fábio

"Eu só quero viver em paz". Pastor diz não rejeitar seu passado e que quer ser livre do sistema religioso

Por Danilo Fernandes

 

Depois de vários anos sumido do noticiário nacional, o pastor Caio Fábio D’Araújo Filho voltou às manchetes no fim do ano passado. Réu na ação movida contra ele por conta do episódio conhecido como Dossiê Caimã – conjunto de documentos falsos que, pouco antes da eleição presidencial de 1998, acusava altas figuras do governo de ter contas secretas naquele paraíso fiscal –, Caio foi condenado por uma juíza federal a pouco mais de três anos de reclusão. Cabe recurso, e o pastor já avisou que vai até às últimas instâncias. “A juíza quer aparecer”, ataca, sustentando a mesma versão que conta desde o início do imbróglio: a de que foi envolvido inocentemente numa conspiração política. Essa parte de seu passado, bem como muitas outras, já não são conhecidas pelas novas gerações de crentes. Contudo, os evangélicos mais maduros sabem que Caio foi a mais destacada liderança evangélica já surgida no país, cuja visibilidade, catapultada por uma ação ministerial intensa – como a criação da organização Visão Nacional de Evangelização, a Vinde, e da Fábrica de Esperança, megaprojeto social que atendeu centenas de milhares de carentes num conjunto de favelas do Rio –, marcou época entre os anos 1970 e 90.

Hoje, Caio olha para esse passado com serenidade. Ele diz que não repudia nada do que fez, mas que não quer mais saber de ser a figura pública, aclamada e requisitada de outrora. “Esse tempo acabou definitivamente para mim. Minha alma não tolera mais a possibilidade dessa vida itinerante”, diz, em sua casa em Brasília. Cercado de árvores, jardins e recantos, é dali que ele grava os programas que exibe pela internet, parte importante das atividades do Caminho da Graça, ministério que hoje capitaneia. Tida como uma igreja de perfil alternativo, o grupo reúne-se em várias cidades brasileiras e, segundo Caio Fábio, procura restaurar o sentido da comunhão cristã. “Ele é um movimento conduzido pela Palavra e pelo Espírito Santo. Queremos que  invada a massa, abranja tudo e se torne incontrolável como o vento que sopra onde quer”, diz, com a retórica privilegiada que conquistou milhões de admiradores e fez sucesso em mais de 100 livros publicados. De certas experiências do passado, ele não esconde a dor – como a separação de sua primeira mulher, Alda Fernandes, com quem teve quatro filhos, e a trágica morte de Lukkas, o terceiro deles.  Contudo, embora muito criticado e contestado ao longo desses anos todos, ele assegura, “diante de Deus”, que não sente mágoa de ninguém. Aos 57 anos de idade, casado com Adriana Ribeiro, Caio Fábio D’Araújo Filho se diz em paz. “Eu sou livre. Sou nascido do Evangelho, nascido de Jesus. Hoje, sirvo ao Senhor e não preciso perder o meu ser, a minha saúde, a minha paz, o meu convívio familiar. Isso é graça de Deus para mim!”

 

CRISTIANISMO HOJE – Recentemente, o senhor voltou ao noticiário com a notícia de sua condenação no processo que investiga o episódio do Dossiê Caimã. Como ficou esse processo?

CAIO FÁBIO D’ARAÚJO FILHO – Meu advogado entrou com recurso e eu ganhei. Agora, deve seguir para outra instância. Esse processo é uma loucura inominável. Até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que seria o maior prejudicado se a história fosse verdadeira, já veio a público me isentar de qualquer culpa.

 

Se sua inocência é tão óbvia como diz, por que um assunto praticamente esquecido pela opinião pública foi trazido novamente à tona?

Por iniciativa de uma juíza federal que gosta de aparecer. Como o episódio foi um fato histórico que envolveu até a Presidência da República, ela quis ser a mulher que decretou a prisão do indivíduo que seria o boi de piranha daquele negócio todo. Um grupo de advogados amigos de São Paulo queria até entrar com uma representação contra ela perante os conselhos de Magistratura, porque acharam que ela passou dos limites. Mas o advogado que me representa nos autos não deixou.

 

A quem interessaria uma condenação sua?

Ah, interessaria a muitos religiosos. O próprio pessoal da imprensa que me ligou disse que isso é uma coisa surreal, que aquela mulher é doida. Ninguém acredita em nada daquilo. Só a Folha de São Paulo é que deu com um destaque maior por uma razão política que eu não vou dizer aqui. E a TV Record [ligada à Igreja Universal do Reino de Deus], por razões óbvias. Estou junto como réu ao lado de Paulo Maluf e Lafayette Coutinho. No entanto, só eu fui condenado! Mas olha, se, por algum motivo totalmente inexplicável, esse negócio chegar ao Superior Tribunal de Justiça, será liquidado lá. E, se por alguma insanidade passar e for ao Supremo, vai morrer na praia.

 

O senhor trabalha com a hipótese de uma condenação definitiva?

Se, por alguma conjunção cósmica totalmente irracional, eu for mesmo condenado a prestar serviço comunitário ou fazer ação social, eu vou dar um grande “aleluia”, porque estarei sendo condenado a ser eu mesmo, a fazer o que sempre fiz esses anos todos, por minha total iniciativa.

 

O senhor concebeu e liderou um dos maiores projetos de cunho social de iniciativa de evangélicos já feitos neste país, a Fábrica da Esperança, considerado o maior do gênero na América Latina. Com esta credencial, como o senhor avalia a relativamente pequena atuação da Igreja brasileira na área social, ainda mais evidenciada quando consideramos as altíssimas somas de dinheiro arrecadadas pelos grandes ministérios e denominações?

Não existe nenhum grupo mais ególatra dentre todos os movimentos religiosos planetários do que o movimento evangélico. Isso por causa da semente dele – a semente é má, é de divisão. A semente original, de protesto contra a Igreja Católica, transformou-se numa semente de protesto existencial contra tudo. Essa divisão criou a ênfase no dogma doutrinário. Isso divide, qualquer que seja o desencontro, em qualquer nível na escala de valores. Falta tolerância naquilo que não tem significado para a salvação, no que não altera o DNA do Evangelho. Esse tipo de tolerância no olhar nunca existiu. O que se instituiu foi a prevalência do existencialismo espiritual, e esse não lida com as categorias objetivas de valor. E logo o chamado movimento protestante virou esse guarda-chuva evangélico, sob o qual cabem todas as coisas. Quando é que pode haver unidade e serviço ao próximo se, no meio evangélico a unção para nada serve senão para erigir egos? A unção do Espírito Santo deve redundar no amor, na compaixão, na misericórdia, no serviço – mas a “unção” que vemos aí só tem poder para criar lúciferes com purpurina na cara, que atuam em palcos com luzes. 

 

Em função deste e de vários outros projetos e iniciativas, o senhor levantou muito mais recursos do que o de diversos líderes de hoje, que estão até comprando aviões particulares.  À época, o senhor teve o seu?

Nunca tive avião ou helicóptero. Faz parte da minha filosofia não adquirir nada. Nem esta casa onde vivo eu comprei, ela me foi alugada a um valor simbólico por três senhoras amigas. Eu nunca comprei coisa nenhuma, nunca acreditei em compra de nada. O Caminho da Graça nunca vai comprar nada. Creio que imobilizar dinheiro do povo de Deus com patrimônio físico é pecado. Quem diz que a nossa pátria está nos céus e faz aquisições poderosas ou erige templos salomônicos está pecando contra o espírito do Evangelho. Tudo o que eu construí e mantive era alugado. Passei 25 anos declarando que não tinha o menor compromisso com a manutenção de coisa alguma que virasse um fim em si mesmo. Quando você é dono de propriedades, você acaba vivendo para fazer a manutenção de tudo e as coisas perdem a finalidade.

 

E o senhor vive de quê?

Sempre vivi exclusivamente do ministério. Todos os direitos autorais dos meus livros e a renda obtida com nossas atividades no passado – TV, rádio, revista, editora – era voltada para a atividade missionária, social, evangelizadora e de treinamento. Era tudo reinvestido naquilo que fazíamos. E continua sendo assim hoje.

 

Quem o ouve falar percebe que o senhor faz questão de traçar uma linha divisória entre o que é hoje e o que fez, em especial em relação ao seu passado institucional, quando era uma figura pública dentro e fora da Igreja. Há algo que o senhor repudia em seu passado?

Não. Eu nunca rechacei meu passado. Só não faria de novo. Naquela época, contudo, foi necessário. Só de uma coisa me arrependo no meu passado institucional: ter aceitado a imposição de ter sido feito presidente da Associação Evangélica Brasileira [AEVB], pela qual eu mesmo trabalhei muito para ver criada. Eu não queria a função, mas fui eleito por aclamação. Praticamente me obrigaram a aceitar, porque a entidade surgiu com o patrocínio da Vinde. Noventa por cento da AEVB estavam ligados aos ministérios que eu dirigia. Eu não queria e nem precisava presidir a AEVB. Pelo contrário – eu é que dei mídia para ela.

 

Mas a AEVB não cumpriu um papel importante na época? Afinal, ela esteve à frente de movimentos marcantes dos anos 90, como o Celebrando a Deus como Planeta Terra, o Rio Desarme-se e o Reage Rio, entre outras mobilizações que contaram com o apoio dos evangélicos.

Quando se criou a AEVB, a gente já havia perdido tempo demais discutindo o sexo dos anjos. Já estávamos correndo no vácuo do prejuízo. Esperamos muitos anos num processo lento, de muita conversa infrutífera. A AEVB só surgiu em 1991, depois que o [bispo Edir] Macedo já havia começado a dar as cartas do neopentecostalismo brasileiro. A AEVB foi criada com apoio desse pessoal que agora fundou a Aliança Cristã Evangélica Brasileira e de outros, mas ninguém botava dinheiro, ninguém se mobilizava para fazer nada.

 

O senhor foi convidado a participar da Aliança?

Não fui convidado, e mesmo se fosse, não iria, porque não acredito mais nisso. Todos esses irmãos queridos que estão lá sabem que eu sempre quis ser livre para dizer o que eu queria.  Esse tipo de iniciativa tinha que ser criada bem antes, lá no início dos anos 1980, quando havia muita gente séria, respeitável, de corações generosos. Isso tinha de ser criado logo depois do Congresso Brasileiro de Evangelização, em 1983, que para mim foi o maior evento representativo da história da Igreja brasileira. Ali ocorreu a grande oportunidade de unidade. As almas ainda estavam ingênuas, puras, sinceras. A teologia da prosperidade não existia por aqui, o que prevalecia era a teologia da missão integral. Havia uma quantidade enorme de pastores piedosos e desejosos de ver o melhor de Deus acontecer neste país. Creio que, àquela altura, ainda dava tempo de a Igreja ter um papel de relevância e significado, Ainda dava para virar as coisas e não perder os significados do termo evangélico.

 

A sua separação foi um acontecimento público, que envolveu adultério. Naquela época, isso ganhou enorme peso perante a Igreja. No entanto, já àquele tempo diversas denominações já ordenavam pastores divorciados e encaravam a questão de forma liberal. Também são muitos os exemplos de pastores famosos – alguns, líderes de denominações – que se divorciaram em condições semelhantes às suas, mas a repercussão em nada se aproximou do tratamento que lhe foi concedido. Por que o seu caso, até hoje, suscita tanto escândalo? O senhor se considera perseguido?

Eu daria três razões para este tratamento especial e a grande comoção que o episódio causou. Em primeiro lugar, a minha situação para essa moçada toda foi insuportável. Ministerialmente, eu funcionava como uma espécie de foice, rodando em cima de cabeças conceituais. Toda vez que aparecia um maluco – e eu nunca precisei nominar os malucos, apenas expunha seus erros e dizia que o Evangelho era de outro jeito –, essa foice cortava logo aquela cabeça, o cara virava herege. Por isso, todo mundo tinha medo de que minha opinião conceitual colocasse alguém em situação difícil. Eu tenho certeza absoluta da quantidade enorme de gente que torcia por uma fragilidade de minha parte justamente por causa desse papel que eu exercia. E esse não foi um papel que eu pleiteasse ou buscasse; ele aconteceu espontaneamente. Foi Deus que fez isso por sua graça, eu só estava pregando o Evangelho, que, aliás, é o que eu sempre fiz.

 

Então, o senhor acredita que parte desta liderança que ai está não teria o espaço que tem se não fosse a sua saída do cenário? Seu espólio foi negociado?

Com certeza. Não preciso falar nada. Basta ver até 1998 quem era quem e o que aconteceu de 2000 em diante. Quer ver uma coisa? Logo depois do que aconteceu, diante daquela comoção toda sobre o que tinha acontecido comigo, houve uma reunião de 300 pastores em São Paulo especificamente para tratar sobre quem ia ficar com qual parte do meu despojo, para saber quais eram os espaços que eu havia deixado abertos e quem deveria ocupá-los. E foram milhares que também fizeram isso. Não quero nem falar de traição, porque no meu coração já estão todos perdoados, mas se eu abrisse a boca ninguém ficava em pé.  Esta foi uma razão. Em que pese o fato de que eu cometi um ato pecaminoso de traição e infidelidade, isso está longe de ser a causa principal da grande comoção. Sabe qual foi a causa? Eu ter tomado a iniciativa de contar tudo, ou seja, por minha vontade expor tudo em verdade, sem que qualquer coisa tivesse sido descoberta por ninguém. E eu que ouvia a confissão de tantos deles e sabia de suas fraquezas, das promiscuidades… E, depois, estes mesmos iam à TV bater em mim confiando na minha integridade, pois sabiam que eu não os exporia.

E a terceira razão foi que, naquele momento, eu aproveitei a oportunidade e pulei fora do barco. Este foi o elemento mais doído de todos. A Igreja Presbiteriana me propôs uma discipina como condição para minha restauração. Eu respondi que não estava pleiteando nada, e que estava me desligando da denominação unilateralmente. Eu não queria mais ser parte daquilo. Escrevi três cartas e eles não aceitaram nenhuma.  Pensei: “Meu Deus, isso aí não é a máfia, da qual o camarada só sai morto”! Depois me propuseram dar o tempo que eu julgasse necessário e que, depois, se eu quisesse voltar, seria restaurado e estava tudo certo. Mas eu disse que não queria.

 

O que passava pela sua cabeça naquele momento. O que o senhor desejava? Para onde queria ir?

Eu queria vir para cá! Queria voltar aos meus 18 anos... Eu nunca quis ser pastor ordenado. Eu sabia quem eu era e que Deus tinha me ungido. Sabia que isso tinha vindo do céu, e que não dependia de ninguém. Foi a Igreja Presbiteriana que disse que não era possível que eu, aos 19 anos, em Manaus,  fosse considerado pastor pela cidade inteira,  pregasse a Palavra sem ser ordenado pastor e sem aceitar ir para ao seminário.

 

Então a questão crucial foi a rejeição?

Sim. Eles agiram passionalmente. Era como se dissessem: “Nós amávamos esse cara e ele decidiu não ser mais parte do nosso grupo”. E, conquanto eu estivesse fazendo aquilo sem que, na minha mente, quisesse ofender nenhum daqueles irmãos, o que eu não queria era, depois do acontecido, ter de me curvar a nenhum tipo de restauração humana, mentirosa, hipócrita e plástica que queriam me oferecer. Eu sabia que o único a me restaurar era o Senhor. Eu não aceitaria nada que não viesse daquele que me ungiu e sabendo que entrar naquele esquema era vender a minha alma. Então, eles aproveitaram essa minha atitude para vender ao povão a ideia de que eu estava rebelado contra a comunhão dos santos e o amor dos irmãos.

 

Ao longo dos anos, foram construídos certos mitos a seu respeito e que o rotulam como extremamente liberal e até antibíblico. Um deles é de que o senhor, devido ao que lhe aconteceu, seria um incentivador de divórcios, em especial de pastores. O que o senhor tem a dizer sobre isso?

Isso é uma suposição absurda. Já haviam acontecido milhares de separações de pastores antes da minha. E muita dessa gente vinha me contar os dramas conjugais e chorar as mazelas comigo. Então, é hipocrisia dizer que o que me aconteceu é que abriu as portas para que outros pastores adulterassem ou largassem da mulher. Essa percepção a meu respeito é suscitada pelo diabo na cabeça de muita gente doida. Eu nunca defendi o divórcio. Defendo que continuem casados aqueles que se amam, mas que todos aqueles que se fazem mal, que se machucam, que se ferem e se odeiam, não deveriam estar casados, pelo bem de suas almas. Sempre aconselhei todo mundo a não adulterar, a não trair a mulher. Quando cheguei aqui em Brasília, no meu primeiro ano o que eu mais fiz foi atender pastores e mulheres de pastores que queriam se divorciar e vinham me pedir aconselhamento. Gente de tudo quanto é igreja – batistas, assembleianos, presbiterianos, pentecostais. Na medida do possível, ajudei esse pessoal todo a não se divorciar. Eu dizia a quem me procurava com casos extraconjugais: “Sai dessa, você vai se estrepar com essa amante”. O que Deus uniu, que o homem não separe; e o que Deus não uniu, que não se ajunte, porque vira uma desgraça. O que me aconteceu foi, isso sim, um ato pecaminoso, de traição e de infidelidade. Um pecado diante de Deus e perante a mãe dos meus filhos. Mas o que me aconteceu não teria derrubado nada que já não estivesse demolido. É ridículo dizer que meu caso serviu de legitimação para os atos de quem quer que seja.

 

Por falar nisso, como é sua relação com Alda Fernandes, sua ex-mulher?

Ela é minha amiga. Passamos o último Natal juntos. Estamos sempre com nossos filhos e netos.

 

Quando seu filho Lukkas morreu atropelado, em 2004, houve quem atribuísse a tragédia e um juízo de Deus sobre sua vida. O que o senhor sentiu na época e como lida hoje com as pessoas que o criticam?

Só tive coração para a dor e a saudade pela partida do meu filho. Nada do que soube que disseram teve poder de gerar qualquer coisa ruim em mim. O que senti naquele momento foi paz, e se todos os meus filhos morressem, a minha resposta seria a mesma. E tem mais uma coisa – não existe ninguém, nenhum ser humano, que eu não tenha perdoado. Digo isso diante do Deus vivo e dos principados e potestades malignas. Meu coração nunca dormiu com ira em relação a ninguém, eu não tenho ódio nenhum para contar. Não tenho inimizades contra pessoas. Por outro lado, tenho opiniões a dar sobre ideias e conceitos equivocados de quem quer que seja. Não é por causa do fato de eu não ter inimizade pessoal por um indivíduo que vou deixar que a vandalização do Evangelho aconteça sem que eu me una a Paulo na luta comum da defesa do Evangelho, como todo aquele que carrega o temor de Jesus no coração.

 

Esse seu discurso costuma ser extremamente crítico em relação ao que chama de “igrejas institucionalizadas” e “sistema religioso”. Na sua opinião, as igrejas não têm nada de bom?

Mas é claro que têm coisas boas! Elas têm gente boa, e gente é o que existe de melhor em qualquer lugar. Ministério, para mim, é gente, só é bom se for feito por gente e para gente. Está cheio de gente boa de Deus nas igrejas. Mesmo quando há um pastor paspalhão lá na frente, os bancos estão repletos de gente boa, que sente até pena daquele indivíduo lá na frente, que faz negócios para todos os lados e com quem apareça. Tem gente que suporta o púlpito muito mais para não perder os relacionamentos de comunhão e o convívio de anos com os irmãos. Eles sabem que aqueles caras lá na frente vão passar, as modas vão passar, mas eles vão continuar ali. Existe gente maravilhosa nos ministérios. Veja aquele pessoal da Juvep [Juventude Evangélica da Paraíba, entidade que atua de maneira missionária no sertão nordestino], por exemplo. Eles perseveram há anos na mesma purezinha de alma, na mesma ideia de serviço ao próximo. Há também a Jocum [Jovens com uma Missão, movimento missionário internacional], com seus tantos braços de ação penetrados nos lugares mais distantes, em favelas, em comunidades miseráveis, em bolsões de carência no mundo todo.

 

O Caminho da Graça é uma espécie de reinvenção da igreja?

Não, ele é simplesmente a sequência de um caminho que eu sempre trilhei. O Caminho da Graça é a expressão de visibilidade de uma coisa subversiva que eu incito. Eu tento fazer com que o Caminho seja apenas, com muita leveza, um elemento de visibilidade mínima da possibilidade de uma comunhão cristã sem que uns mordam e devorem uns aos outros. Por isso, não tenho aquele desejo de fazê-lo crescer, ter expansão numérica simplesmente – quero que o que cresça seja essa coisa que ninguém nomeia, um movimento conduzido pela Palavra e pelo Espírito Santo que invade a massa, abranja tudo e se torne incontrolável como o vento que sopra onde quer.

 

O senhor diz que o Caminho da Graça é um movimento não institucionalizado, mas recentemente nomeou presbíteros e diáconos para sua sede em Brasília. Isso não vai acabar tornando o ministério como uma das igrejas que o senhor tanto critica?

Nós funcionamos baseados em dons, e não em hierarquias. Nas igrejas convencionais, o diácono é mais do que o membro e o presbítero é mais do que o diácono. Aqui no Caminho, essas funções expressam simplesmente dons de serviço. O presbítero, o mentor, não é um sujeito mais elevado na hierarquia, não tem poderes ou prerrogativas especiais. Ele é simplesmente o cara que surge pela observação dos outros: “Puxa, quanta sabedoria fulano tem recebido e manifestado”. Essas funções surgem por opiniões múltiplas, não existe reunião de concílio ou votação para escolher ninguém. E tem outra coisa: se, algum dia, lá na frente, o Caminho da Graça deixar de ser o que nasceu para ser, é a coisa mais simples do mundo – acaba tudo e começa outra vez. O problema do pessoal é que eles querem se eternizar. Querem que o grão de trigo dure para sempre, mas se o grão não morrer, não há fruto. Eu não quero perenizar nada. Eu só tenho o compromisso de servir à minha geração, não quero deixar nenhum legado, nenhum império. É preciso reconhecer que a vida é cíclica. Eu já acabei com muita coisa que tinha começado no curso da minha vida. E que ninguém duvide que, se eu tiver vida longa e alguma coisa que estou fazendo hoje se corromper lá na frente, eu mesmo vou lá e termino com tudo, não espero, não.

 

A manutenção do Caminho da Graça e dos ministérios a ele ligados é feita através de dízimos e ofertas?

A gente recolhe ofertas. A espontaneidade da dádiva tem que ser baseada no amor, na alegria de dar. Quem pode dar mais, dá mais; quem pode dar menos, dá menos; e quem não pode dar nada não dá nada, recebe. Paulo ensinou que é justo que aqueles que recebem bens daqueles que lhes ministram os galardoem e ajudem com bens. Mesmo com toda a capacidade que Jesus tinha de multiplicar pães e peixes e de transformar água em vinho, ele era sustentado pelas ofertas práticas e objetivas das mulheres que o serviam e de outras pessoas. O princípio espiritual da doação era operativo na vida e no ensino de Jesus e no Novo Testamento como um todo.

 

E quanto ao dízimo? Nesta ótica, ele seria antibíblico?

O que as igrejas ensinam é lei, é obrigatoriedade. A Igreja tornou-se uma espécie de agente substitutivo do antigo templo de Jerusalém, uma espécie de “receita federal” de Deus. É uma coletora de impostos. O dízimo é esse imposto, e ainda dizem que quem não pagar vai sofrer as desgraças descritas no capítulo 3 de Malaquias. Como a Igreja não ensina a obediência ao Evangelho como resultado do amor de Cristo constrangendo nosso coração, como Paulo ensina em II Coríntios 5, as pessoas não veem a questão da doação como algo inerente à generosidade.

 

Se um homossexual assumido quiser frequentar o Caminho nesta condição, como ele será tratado?

Nunca ninguém chegou no Caminho da Graça dizendo para mim que é gay praticante e que quer ficar ali. Mas não sou persecutório e nem homofóbico acerca de nenhum ser humano. Se ele quiser ficar, ouvirá o Evangelho e saberá que esse Evangelho pode criar um espaço de generosidade misericordiosa para ele ouvir a Palavra de Deus e crescer – mas nunca ouvirá uma única palavra de incentivo a qualquer relação sexual que não seja heterossexual.  Se eu fizesse isso, estaria estabelecendo um paradigma que não encontro nenhum precedente para estabelecer.

 

Logo, ainda que solicitado, o senhor não celebraria um casamento gay?

Eu não faço esse tipo de casamento, até porque a união estável entre homossexuais não é casamento, é uma relação societária, uma empresa limitada. O Estado tem o dever de defender essa relação no que se refere ao respeito à propriedade, aos bens. Se dois gays que construíram uma vida juntos, com aquisição de bens e tudo o mais, resolvem não mais viver em comum, que se divida o que têm, e cada um leva a sua parte. Isso é uma questão de Estado, não tem nada a ver com a Igreja. Mas não estimulo nenhum tipo de união estável, a não ser aquela estabelecida entre homem e mulher que se amem.

 

Sua maneira de falar e até as roupas que o senhor tem usado provocam muitos comentários. A esta altura da vida, o senhor sente-se livre para dizer e fazer o que quer?

Pelo amor de Deus, você não pode mais ser o que é? Eu me visto desse jeito porque gosto. Eu sou só um carinha que deseja viver. Quem não gosta do meu jeito é livre para viver da maneira que quiser. Eu sou livre como o Evangelho. Sou nascido do Evangelho, nascido de Jesus. Sou como o vento, nascido do Espírito Santo. Quem não suporta minhas declarações, minha sinceridade e a propriedade do que digo que vá dormir com esse barulho.

 (Colaborou Carlos Fernandes)

Fonte: http://www.cristianismohoje.com.br

 


 

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